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Armagedon - Um Mundo em Caos / Final Odyssey de Fernando Athayde dos Santos é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Vedada a criação de obras derivadas 3.0 Unported.
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quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Um Mundo em Caos - 41


Alguns minutos antes.
Belial e Yulia continuam parados na praça central de Moscou e um clarão surge no céu e uma figura masculina alada pousa bem próxima a eles.
— Eu já esperava por você. — comenta Belial.
O homem ergue a cabeça e revela ser Gabriel, o Arcanjo mensageiro.
— Eu vim acabar com essa mulher! — e caminha em direção aos dois. — Então saia da minha frente, criatura asquerosa! — ordena.
— Gabriel, você nem é o mais poderoso dos Arcanjos para pensar em me dar ordens. — fala Belial. — E acredito que nem o mais poderoso de vocês seria capaz disso. Acredite quando eu digo, nem Miguel seria capaz.
— Você fala demais, vil criatura! Se você quer tanto se pôr no meu caminho, será o primeiro a tombar!
— Você realmente não sabe quem sou, não é?
— E nem me interessa saber. — responde. — Você cairá e nunca será lembrado.
— Sabe qual é o problema de vocês Arcanjos? É pensarem que são deuses! Mas vocês não são! Entenda isso!
— Cale-se! — exclama. — Eu sou um Arcanjo! Chefe de minha própria Legião de anjos guerreiros! Possuo mais de mil anjos sob minhas ordens! E quando eu ascender novamente, juro que irei descer até as profundezas do Inferno e caçarei cada um dos demônios restantes!
— Você é arrogante demais. Se acha invencível. Indestrutível. Mas eu vou lhe mostrar que existem seres muito mais antigos e fortes que você. — avisa.
Gabriel sorri e se lança em ataque. Ele cerra o punho e prepara um poderoso soco, mas Belial segura o punho de Gabriel parando o golpe. E com uma leve pressão nos dedos, quebra os ossos da mão do Arcanjo.
Um urro de dor é proferido através das cordas vocais de Gabriel.
— Eu lhe avisei que existiam seres muito mais fortes e antigos que você. Como que pode nunca terem falado sobre a minha pessoa no Paraíso. Como pode Metatron nunca ter comentado sobre a minha existência. Até me sinto insultado com isso. — e encara Gabriel. — Garoto! Eu fui o primeiro!
E um golpe vindo de baixo atinge Gabriel no flanco esquerdo e o joga longe. Gabriel se apóia no chão e Yulia dá um passo à frente e diz:
— Pequeno pássaro, Lorde Belial é o mais poderoso dos demônios infernais. Ele é um rei no Inferno. Possui seu próprio reino e nem mesmo Lúcifer ousou enfrentá-lo. E não esqueça que Lúcifer rivaliza com Miguel em força, inteligência e liderança. Mas Belial é muito superior aos dois juntos. Belial foi o primeiro Arcanjo da criação na hierarquia celestial. Antes de Lúcifer, outro Arcanjo se rebelou, e é este que está na sua frente. Lúcifer foi o segundo. A história foi maquiada para vocês nunca saberem que seu Deus não é perfeito. E devido a tal rebelião, Belial foi transformado em um dos demônios do Apocalipse.
— Não pode ser. — murmura Gabriel. — Porque nunca nos falaram sobre isso? Como puderam esconder isso de nós. Eu que sempre segui todos os preceitos divinos, sempre fui leal e agora ouço isto? Que a história que eu conheço não é a verdadeira, que Lúcifer na verdade foi o segundo a se rebelar? — fala, consternado. — Mas eu não vou me deixar derrotar! Preciso ir até o Altíssimo e perguntar isso pessoalmente! — e se ergue.
— Creio que não haja tempo para você poder ir até Ele fazer essa pergunta. — comenta Belial. — A chuva já vai começar.
— Como assim? Não há tempo?
— Mais alguns minutos e você compreenderá o que estou dizendo. Não vou dizer por que será mais divertido você ver com seus próprios olhos.
— Eu vou acabar com isso de uma vez! — esbraveja Gabriel, se lançando em ataque mais uma vez.
— Criatura ignorante. — suspira Belial. — Ninguém pára o Apocalipse, nem o próprio Deus.
Gabriel ataca com a mão boa, mas Belial mais uma vez segura o ataque e desta vez golpeia o braço do Arcanjo e o quebra, deixando uma fratura exposta. Gabriel cai de joelhos no chão com o braço esticado, e Belial o chuta forte no rosto. Gabriel sai deslizando pelo chão e abrindo uma vala por onde passa. O desmaio é inevitável.
Belial ergue a cabeça e pressente a chegada de alguém.
— Mais um Arcanjo se aproxima. — fala, olhando para Yulia.
— É Miguel?
— Creio que sim. E meus dois demônios foram derrotados... Naamah acabou de ser destruída. — e baixa a cabeça. — Aquela ex-deusa não pode ter derrotado ela.
— Deve ter sido aquela mulher-Arcanjo.
— Também acho. A aura dela é menos poderosa do que essa que se aproxima agora. Mas há outras duas não muito longe daqui. Uma é negra como a noite e emana morte e sofrimento. A outra é calma e tranqüila. Vinha se movimentando velozmente nesta direção, mas num determinado ponto diminuiu a velocidade e permanece assim desde então.
— A aura negra é de Lúcifer?
— Exato. A aura dele ainda é semelhante à de um Arcanjo, só que ao invés de luz é trevas.
— O que será que ele está tramando?
— Não faço idéia. Mas duvido que seja nos atacar. Lúcifer não é burro. O que quer que ele faça, não será diretamente. Passo a acreditar até em ele querer forjar uma aliança.
Nisso, Miguel pousa violentamente próximo a Gabriel, afundando o asfalto e abrindo uma cratera. Sua expressão é séria e seu corpo está rijo como uma rocha.
— Enfim, o General Celestial resolveu aparecer. — fala Yulia.
— A festa está quase completa. — comenta Belial, sorrindo.

Próximo dali, Raguel pousa atrás de um grande prédio e Jennifer se solta dela.
— Eu quero que você fique aqui. — pede Raguel. — Ainda não sei o que está acontecendo lá, mas sinto que alguma coisa ruim aconteceu, só não sei o que.
— Você acha que o Miguel morreu? — pergunta aflita.
— Nada tão sério assim. — responde. — É que sinto duas auras bem fracas lá. Acredito que uma seja do Miguel e a outra do Gabriel. E antes de ir, preciso que você fique em segurança aqui. Não posso me preocupar com você no caso de um ataque repentino. Me entende?
— Claro que entendo. — responde. — Eu ficarei aqui lhe esperando. Não se preocupe comigo.
Raguel assente com a cabeça e alça vôo em direção ao céu. Alguns minutos depois, ela está sobrevoando a praça e avista Miguel caído no chão. Ela dá um rasante e pousa ao lado do Arcanjo. Raguel se agacha ao lado dele e ergue levemente sua cabeça.
— Está tudo bem com você? — pergunta.
— Sim. — murmura.
— O que aconteceu aqui? — e olha para os lados avistando Gabriel e Rafael desacordados, caídos no chão. — Vocês derrotaram o Cavaleiro?
— Sim. — responde. — Foi uma luta difícil, eles eram muito fortes, mas no final nossa força prevaleceu.
— E o Gabriel e o Rafael estão...
— Vivos? — completa. — Sim, estão, minha leal amiga.
— Leal amiga?! — pensa. — Ele nunca me chamou assim. — e olha Miguel bem nos olhos e percebe um brilho diferente em seu olhar. Um brilho que lembra a morte. — Você não é o... Agh! — sangue brota de sua boca e ao olhar para baixo, a mão do Arcanjo está enterrada em seu abdômen.
— Realmente eu não sou o Miguel. — responde. — Eu sou o demônio da criação de falsidades que parecem bem reais. Eu sou um dos presidentes das regiões infernais que Belial é o Rei. E você caiu como um patinho na minha armadilha. Deixou-se levar pela emoção e não viu as evidências que normalmente me denunciam. No meu caso, meus olhos.
O cenário a sua volta começa a transmutar e a verdadeira cena aparece. Um demônio está prendendo Miguel com os braços em volta de seu pescoço e ao seu lado em pé, está uma mulher loira, Yulia. E mais ao longe, se encontra Gabriel caído ao chão, desacordado.
Raguel olha novamente para o falso Arcanjo e agora ele está em sua verdadeira forma. A criatura tem aparência humanóide, e veste um amplo robe negro sobre uma brunea. Raios vermelhos irradiam de seus olhos. E as órbitas do elmo metálico irradiam uma luz ameaçadora.
— Eu não consigo me mexer! — pensa, tentando movimentar o corpo. E ao tentar falar, sua boca não se movimenta.
— O que foi? Não consegue se mexer? — pergunta o demônio em tom sarcástico. — É o efeito do veneno que existe sob minha pele. Ele tem o poder de paralisar quem me toca.
Raguel arregala os olhos e sua expressão é de puro pavor. Nesse momento, a mulher-Arcanjo se torna uma menina, com os mesmos sentimentos humanos e o medo de morrer. E para os seres Celestiais, a morte é o fim de tudo, pois ao contrário dos humanos, não possuem uma alma para ascender ao Paraíso.
— Eu consigo ver o medo em seus olhos. Consigo sentir o suor frio percorrer seu corpo. Jamais pensei que seres Celestes possuíssem tal sentimento. Um sentimento tão humano. E agora eu me pergunto, você também sente dor? — e enterra o braço mais fundo no corpo de Raguel, indo próximo ao coração.
Os olhos dela reviram e lágrimas pingam sobre o rosto do demônio.
— Aí está a resposta para a minha pergunta. Você sente dor, sim. Engraçado isso. — e sorri maleficamente.
E próximo dali, Belial assiste a tudo e obriga Miguel a assistir também.
— Está faltando um Arcanjo não está? — pergunta Yulia.
— Sim — responde Belial, — e falando nisso, sinto uma aura se mover velozmente em nossa direção. — e olha rapidamente para o demônio que está junto de Raguel e ordena: — Zagan, mate-a de uma vez! Mais um Arcanjo se aproxima!
— Não faça isso. — suplica Miguel. — Não a mate, por favor, eu lhe imploro.
Belial olha para Miguel e sorri.
— Acabe com ela de uma vez! — grita Belial.
— Nããããããããooooooooo!!!! — berra Miguel.
Zagan afunda a mão no abdômen de Raguel e ao puxar o braço, vem trazendo na mão o coração todo ensangüentado da mulher-Arcanjo ainda batendo. O demônio empurra o corpo de Raguel para o lado e se levanta erguendo o coração como um troféu. Nisso, um homem alado vestindo roupas negras dá um rasante e agarra Zagan pela cintura e o eleva aos céus. Lá em cima, desfere centenas de golpes e segura o demônio pelos ombros e o rasga em dois. Sangue jorra das duas partes do corpo e o homem alado joga as duas metades lá de cima. Antes mesmo que os pedaços atinjam o solo, ele desce em velocidade sobrenatural e pousa ao lado do corpo de Raguel. Ele se agacha e carinhosamente passa a mão no rosto dela.
— Minha doce criança. — e tira o capuz, revelando ser Rafael. — Me perdoe por eu ser tão estúpido e deixar que vocês viessem sozinhos. Eu estava tão imerso em minhas memórias que me isolei de todos em um vulcão na Itália. E quando eu estava vindo para cá, me deparei com a presença de Lúcifer próxima daqui e reduzi minha velocidade significativamente. Eu errei. E sei que jamais terei seu perdão, pois nunca poderei ouvi-lo de você. Mas espere aqui, irei eu mesmo acabar com eles e então levarei seu corpo de volta ao Paraíso para que lá descanse para sempre.
Rafael se ergue do chão e vira-se para Belial, o olhando friamente. Os olhos do Arcanjo em nada se parecem com o que se lê nas escrituras. Não há nada de benevolência e bondade neles, apenas ódio e desejo de vingança.
— Solte Miguel. — ordena Rafael. — Vamos lutar você e eu! — e suas asas se abrem em esplendor.
— Não. — responde. — Eu não irei lutar com você. — e golpeia Miguel na nuca, que cai desacordado no chão.
— Covarde! — esbraveja. — Vai se esconder atrás dessa mulher? Que, aliás, eu sei que é o primeiro Cavaleiro do Apocalipse!
— A minha função aqui não é lutar com ninguém — explica —, apenas assistir e barganhar o espaço que os demônios terão após o fim de tudo. E o seu adversário não serei eu, mas ele. — e aponta para o céu.
Uma fenda negra começa a se abrir no céu e um ser humanóide vigoroso e musculoso começa a sair. Ele tem mais de três metros de altura e sua pele tem uma coloração negra intensa e coberta com pele de animais. Seus traços são acentuados, com orelhas pontudas e um nariz afilado. Seus olhos amarelos são marcados pela crueldade e brilham quando a criatura se movimenta. E dentes amarelados são visíveis sob uma boca escancarada, que a criatura sorri enquanto empunha seu martelo de batalha.
— Conheça Abaddon, um dos Anjos Destruidores do Apocalipse. — fala Belial, apresentando a criatura, que nesse momento pousa ao lado dele.
— Anjo?! — exclama Rafael.
— Sim. E designado por Deus para matar quem quisesse impedir os Cavaleiros ou nós demônios. Vocês já tiveram a sua participação nesse mundo. Agora é a nossa vez de governar e instaurar o caos! Aceite que vocês perderam. Será mais fácil de encarar o que se aproxima. Pois nada dura para sempre, nem mesmo a fria chuva de novembro.
— Eu jamais permitirei que vocês transformem a Terra em um novo Inferno! Demônios imundos! — esbraveja. — Nem que para isso eu tenha que matar um por um de vocês!
— Aceite a verdade, garoto, a era dos demônios chegou. — proclama.
— Não se eu puder impedir! — fala Rafael, tomando posição de combate.
Abaddon dá um passo à frente e pela primeira vez se pronuncia:
— Arcanjo, se eu fosse você sumiria daqui. Há milênios desejo enfrentá-los e quando eu começar, pode ter certeza que só irei parar quando ver o seu corpo inerte no chão.
— Não serei eu a perecer nesse combate! Venha anjo destruidor, venha me enfrentar. — o desafia e pensa: — Com todo esse tamanho, ele deve ser lerdo como um elefante.
Abaddon sorri e desaparece diante dos olhos de Rafael.
— Para onde ele foi? — exclama.
O anjo destruidor surge na frente de Rafael e o golpeia com um soco no abdômen.
 — Urfff! — Rafael cospe sangue e cai de joelhos no chão. — Ele é veloz demais. — pensa. — Só consegui vê-lo quando ele reduziu a velocidade para me golpear. Preciso ficar mais atento. Me enganei achando que ele seria lerdo devido ao tamanho avantajado.
Rafael recolhe as asas e se ergue do chão. Sem as asas, sua mobilidade terrestre aumenta consideravelmente. Sem falar na redução de peso, que aumenta sua velocidade e muito.
Abaddon fica apenas o observando, e Rafael toma a iniciativa do ataque. Ele se lança sobre o anjo destruidor e o ataca com uma saraivada de golpes. Abaddon defende facilmente os golpes utilizando o cabo de seu martelo de batalha, e então golpeia Rafael violentamente na cabeça. O Arcanjo sai voando como se fosse um pedaço de carne arremessado longe. Ao cair no chão, sai rolando feito uma bola.
Abaddon olha para Belial e sorri, batendo com seu martelo no chão.
Rafael pára de rolar pelo chão e fica estirado no meio do asfalto, com sangue vertendo de sua cabeça, e olhando para as nuvens que se movimentam lentamente para o leste.
— Jamais pensei que existiria alguém tão forte. — pensa. — Só não entendo por que Deus criou uma criatura tão poderosa para nos impedir. Ele criou esse mundo com todo o seu amor e ama cada ser vivente, porque iria querer destruí-lo? Não faz sentido isso. E esse demônio falou que esse tal de Abaddon era um dos Anjos Destruidores, isso quer dizer que existem outros. Será que são tão poderosos quanto ele? — divaga. — Nós Arcanjos éramos para ser os seres mais poderosos e os primeiros na linha de combate. Mas nunca enfrentamos criaturas tão poderosas, que rivalizam, tenho certeza, com os Serafins. E porque até agora nenhuma hoste de anjos guerreiros vieram nos ajudar? — se pergunta. — Onde estão as minhas legiões de anjos? Porque me abandonaram? Porque o Criador me abandonou a morte? Nada mais faz sentido. Nem mesmo a nossa própria existência. Preferia ter permanecido alheio a tudo isso, sem nunca lembrar quem eu realmente sou. Mas infelizmente minha mente foi despertada. Despertada apenas para eu assistir o fim do mundo sem poder fazer nada. Que grandes guerreiros nós somos.
Rafael lentamente se ergue e senta-se no chão com as pernas cruzadas.
Abaddon ergue o martelo do chão e sai caminhando na direção do Arcanjo.
— Então, você está vivo. Eu não acreditava mesmo que você pudesse morrer assim tão facilmente.
Rafael encara o anjo destruidor e declara:
— Atinja-me, se você quer me matar.
O que ele diz surpreende a todos, mas não tanto quanto a Belial, que fica aturdido. Pois acreditava que os Arcanjos jamais se dariam por vencidos. E por incrível que pareça, ele não acredita no que acabou de ouvir.
— O que foi? — pergunta Yulia, pondo a mão sobre o ombro do demônio.
— Nada. Apenas um mal-estar. — responde. — Deve ser a falta de costume a respirar esse ar terreno.
Abaddon se aproxima de Rafael e diz:
— Hehehe... Arcanjo, você está provando um pouco do sofrimento característico dos humanos e ficou tomado pela vontade de morrer?
— Esmague a minha cabeça, mas não erre.
— Você é insolente. Mas vejo que seu olhar está morto. O olhar de raiva que você tinha quando me atacou... Aquele olhar que lhe dá esperança e força para viver. Você perdeu esse olhar, vejo que agora está impaciente para morrer. Está se sentindo traído, não está? Pobrezinho. Você me dá nojo! Você quer morrer? Um ser como você, que se banha no sangue alheio? Sinceramente, você é repugnante.
— Você também fede a sangue. — replica. — Como quer me dar lição de moral, se você derramou tanto sangue quanto eu?
— Mas eu só enfrentei os fortes. — treplica. — E pelo menos, eu não levei uma vida como a sua. Você não passa de um lixo que se debate para viver. — e gira o martelo no ar e o arremessa em direção a Rafael.
Rafael fecha os olhos e o martelo passa zunindo no ouvido do Arcanjo e atinge o asfalto mais atrás, abrindo uma enorme cratera.
— Eu poderia ter morrido agora... — pensa. — Tão rápido que meu cérebro não teria nem tido tempo de reagir. Se ele esmagasse a minha cabeça, teria sido o fim. Pffff! Então sou capaz de experimentar o medo de morrer...
Abaddon sacode a cabeça e acerta um chute no rosto de Rafael, o fazendo sair rolando pelo chão e atingir a parede de um enorme prédio.
— Não quer lutar?
Rafael nada responde.
Abaddon o agarra pelo pescoço, e golpeia-o várias vezes com socos e o arremessa longe. Rafael cai no chão e fica inerte.
— Não faça cena! — exclama o anjo destruidor. — Eu nem atingi seu coração para você morrer e muito menos bati assim tão forte em você. — e sai caminhando. — Isso já está ficando chato.
Rafael permanece inerte e sem dizer nada. Abaddon pára ao lado dele e começa a chutá-lo sem parar.
— Quer uma motivação para lutar? Que tal se eu matar o seu amiguinho Arcanjo? — e continua chutando Rafael no chão. — Nem assim você se motiva? Está certo, eu vou te matar então!
Abaddon estica o braço, e o martelo sai voando de onde está e pára nas mãos dele. O anjo destruidor ergue o martelo sobre a cabeça de Rafael e se prepara para esmagá-la, quando uma flecha corta o ar e atravessa as mãos dele, o obrigando a largar o martelo. Rafael olha na direção de onde veio a flecha e vê Jennifer parada segurando uma besta dourada nas mãos e já preparando outra flecha. E de outra direção, surge Surya — carregando uma espada presa a cintura —, pousando ao lado de Rafael.
— Surya?! — se surpreende o Arcanjo.
— Pensou que eu deixaria você morrer? Infelizmente não conseguimos chegar a tempo de salvar Raguel. Mas você e Miguel não morrerão hoje, pode ter certeza disso.
— Então ela voltou a ser uma deusa? — pergunta, ajoelhando-se com uma perna a frente da outra.
— Não — responde —, mas eu fui buscar a arma dela no Olimpo. Não me permitiram, mas mesmo assim eu fui. E Zeus a entregou sem pestanejar.
— Sempre desobedecendo as ordens. — comenta. — Estava com saudades de você.
— Eu também. — retribui sorrindo. — E fica parado enquanto eu curo seus ferimentos.
Belial sai de perto de Yulia e exclama batendo palmas:
— Bela cena! Comovente mesmo! — e olha para Jennifer e vê que ela o está seguindo com a mira da besta. — Não imaginava que a deusinha ali ainda possuía a besta sagrada dela. Jogada de mestre! — elogia. — E Abaddon, fique parado onde está. — ordena. — A flecha daquela besta pode matá-lo facilmente. Não importa quão dura seja a sua pele.
— Então você já saiu do seu buraco imundo, Belial. — fala Surya. — Achei que isso só aconteceria mais para o final do Apocalipse, pois a Besta ainda nem apareceu e Behemoth ainda dorme. Resolveu mudar os planos? Para quem viveu desde a queda no lado mais escuro do Inferno, você está enxergando muito bem. — instiga.
— Planos foram feitos para serem mudados não concorda? — Surya assente com a cabeça concordando e, ele continua: — Então, eu precisava barganhar alguns favores para o meu lado. Por isso decidi agir antes. E eu havia ouvido boatos sobre a interferência de certos Arcanjos que viviam aqui na Terra como humanos. Daí eu acelerei as coisas.
Com uma rápida olhada para Yulia e depois para Belial, Jennifer percebe a distância em que os dois se encontram e mira rapidamente sua besta na direção do coração da mulher e dispara. A flecha zune cortando o ar, e chama a atenção de Belial que se vira para trás e olha a flecha se aproximando mortalmente do peito do Cavaleiro. A flecha crava no peito da mulher e ao mesmo tempo, uma estrondosa trombeta soa, ecoando por todo o mundo e fazendo tremer o chão. Sangue brota do peito de Yulia e ela despenca de costas no chão. Belial solta um urro de raiva e corre na direção da mulher. Com isso, Surya abre as asas e num rápido vôo, agarra Miguel e Gabriel e os traz para perto dela e de Rafael. Jennifer aproveitando a distração de Abaddon e Belial, preocupados com Yulia no momento, corre na direção de seus amigos e se junta a eles.
— Como eles estão? — pergunta Jennifer para Surya.
— Feridos, mas bem. — responde. — Agora vou curar parte desses ferimentos deles e em segundos estarão em pé ao nosso lado novamente. E não pare de manter eles na sua mira. Ninguém escapa das flechas de sua besta.
Rafael se ergue do chão e bate o pó da roupa.
— Nos ver reunidos novamente acendeu meu espírito de luta. Pena Raguel não poder compartilhar desse sentimento. Mas eu prometi levar o corpo dela para descansar no Paraíso. Irei deixá-lo no Éden, onde se manterá intacto para sempre.
Belial vira-se para onde se encontram Rafael e os outros e berra:
— Essa garota maldita matou minha única chance de sair daquele buraco que Deus me colocou! E por isso eu vou matar vocês da forma mais cruel possível!
Jennifer dá um passo à frente e com a besta em punho, avisa:
— Se você ousar nos atacar, uma flecha irá perfurar a sua cabeça. Essa besta não erra o alvo, não importa o quanto ele seja rápido, a velocidade da flecha será sempre dez vezes mais rápida. Então se não quiserem morrer igual a ela, dêem meia-volta e vão embora. Aproveitem que ainda estou dando essa oportunidade a vocês.
— Malditos! — esbraveja e olha para Abaddon. — Não há mais lugar para nós aqui, anjo destruidor. Vamos embora.
Belial — com seu orgulho ferido — e Abaddon saem caminhando vagarosamente.
Nisso, Miguel e Gabriel acordam.
— Onde eu estou? — pergunta Miguel como se saído de um transe. — Para onde vocês me trouxeram?
— Calma. — fala Jennifer, sem tirar Abaddon e Belial da mira. — Você está bem agora. Conseguimos derrotar o Cavaleiro do Apocalipse e impedirmos o fim do mundo bem a tempo.
— Então quer dizer que trouxemos a paz de volta a esse mundo? — fala Miguel se levantando. — Que bom que vocês conseguiram. Eu fui fraco e acabei sendo derrotado por Belial.
— Não esqueça que eu também fui. — fala Gabriel. — Nós dois fomos fracos e fracassamos. — e olha para os lados. — Onde está Raguel?
— Infelizmente ela não conseguiu. — responde Rafael. — Um demônio chamado Zagan, a matou antes que eu conseguisse chegar a tempo de salvá-la. Me perdoe.
— Não tenho porque perdoá-lo, Rafael, estávamos numa luta de vida ou morte e baixas fazem parte, infelizmente. Mas irei dar o enterro que ela merece no Paraíso.
— O Rafael... — e Surya é interrompida por Rafael.
— Eu ia aconselhá-lo a fazer isso mesmo. — fala Rafael. — Ela merece um enterro digno.
— Onde está o corpo dela? — pergunta.
Rafael aponta na direção de um banco. Gabriel sai caminhando e de repente, uma pressão descomunal atinge todos, os fazendo caírem de joelhos no chão e se apoiarem com as mãos. Nuvens negras como uma noite sem estrelas começam a se formar e raios passam a cortar o céu fustigando o chão que tocam.
— O que está acontecendo?! — exclama Rafael.
— Não sei, mas esse poder é grande demais! — fala Miguel.
Nisso, Yulia se ergue do chão e sua fisionomia mudou, seu rosto agora carrega os sinais da destruição, seu olhar brilha como a morte e seu sorriso é traiçoeiro como uma cobra peçonhenta. E com isso, o primeiro Cavaleiro, a Conquista, finalmente desperta por completo.
— Belial! — chama Yulia. — Não há mais o que temer. Esses pobres Arcanjos se matarão ao presenciarem o que irá acontecer em seguida.
Miguel e os outros apenas se olham, mas nada dizem. Belial e Abaddon sorriem maleficamente e passam a olhar para o céu, onde as nuvens tomam o tom vermelho do sangue. Centenas de milhares de relâmpagos estouram e começa a cair a chuva. Mas não é uma chuva comum, é uma chuva de sangue, morno como o sangue que corre nas veias dos vivos. Miguel abre a palma da mão e deixa a chuva cair sobre ela, onde uma pequena poça de sangue se acumula. Ele aproxima a mão do nariz e sente o cheiro metálico característico do sangue. Nisso, penas sujas de sangue começam a cair e ao olharem para o céu, avistam milhares de anjos despencando como se fossem pedras. Corpos alados despedaçados começam a se amontoarem sobre os prédios e as ruas no mundo todo. Yulia desenha um arco com as mãos, e os anjos batem numa redoma invisível e saem rolando em direção ao chão.
— Não podemos deixá-los morrerem! — fala Miguel. — Não conseguiremos salvar todos, mas precisamos tentar salvar os que pudermos!
— Você tem razão! — concorda Gabriel.
— Eu vou com vocês! — fala Rafael.
Ao tentarem abrir suas asas, nada acontece. Elas permanecem recolhidas dentro de seus corpos.
— O que está acontecendo?! — exclama Miguel. — Porque minhas asas não se abrem?
— Deus morreu. — avisa Surya com lágrimas nos olhos. — Não somos mais Arcanjos ou Querubins. Somos humanos de agora em diante.
— Não! — fala Miguel caindo de joelhos no chão e socando o asfalto, inconsolável. — Porque ele morreu? Deus jamais morreria! Ele é a entidade mais poderosa existente. É um ser eterno!
— Não, Miguel, um dia isso iria acontecer, só não se sabia se ia coincidir com o Apocalipse. Já que era o que todos temiam. Ele morreu devido à idade avançada. — responde. — E quando isso acontecesse, nós Celestiais perderíamos o nosso bem mais precioso, a nossa aura. E foi o que aconteceu. Infelizmente os nossos irmãos Celestiais estavam velando os últimos dias do Altíssimo e agora estão caindo do Paraíso e morrendo na Terra. Serafins, Querubins, Ofanins, Arcanjos, Anjos... Todos.
— Então era isso que eles queriam dizer quando falavam que a chuva já iria começar. — comenta Gabriel. — Todos mortos... Deus, minha Legião de Anjos Guerreiros, meus amigos, meus irmãos de armas... Não resta mais nada. Acabou. — e cerra os punhos com lágrimas nos olhos. — Mas mesmo sendo humano, eu vou tentar. — sussurra.
— Tentar o que? — pergunta Rafael.
— Isto! — responde Gabriel, saindo correndo na direção de Yulia.
Yulia movimenta a mão deslocando o ar, e Gabriel é arremessado para trás, caindo próximo de seus amigos.
— Mesmo que você fosse um Arcanjo, o resultado seria o mesmo. — comenta Yulia. — A diferença de poderes ainda seria abissal. Somente um exército de Serafins conseguiria me enfrentar de igual para igual ou o desaparecido Metatron. Ele com certeza teria poderes para isso. Mas agora deve ser apenas um velho a beira da morte vagando pelo mundo.
— Um velho... — pensa Miguel. — Será...?
Yulia olha para Abaddon e ordena:
— Esmague-os! Cansei da presença deles! Quero-os mortos agora!
— Com prazer. — responde Abaddon.
Jennifer aponta a besta para ele e avisa:
— Pare onde está ou eu atiro uma flecha no seu coração!
Abaddon hesita e Yulia diz:
— Não tenha medo, essa flecha nem tocará seu corpo.
Abaddon segue caminhando e Jennifer atira uma flecha. Mas antes dela tocar o corpo do anjo destruidor, se destroça, virando pó. Jennifer recua com o que vê, e Abaddon sorri e sai correndo na direção deles. Quando ele está se aproximando, um ser alado trajando uma cartola negra, blazer negro, calça de couro de crocodilo e sapatos do mesmo material, o golpeia, o atirando longe. Abaddon sai rolando pelo chão e, delicadamente, esse ser alado pousa na frente de Miguel e seu grupo.
— Olá irmão. — fala o ser.
— Lúcifer?! — murmura Surya.
Belial ao longe, apenas observa, sem nada dizer.
Yulia mexe nos cabelos e pergunta:
— Veio nos enfrentar, Rei dos Caídos?
— Se eu quisesse morrer, eu responderia sim. — a resposta sai de imediato. — Mas como eu quero viver, vim fazer outra coisa. — e olha para Miguel sorrindo.
Surya o observa e se movimenta até o lado de Miguel e ali fica.
— Lúcifer — fala Miguel —, como ainda possui suas asas e toda a sua força?
— Simples, meu caro irmão, eu não sou mais um ser Celeste. Minha essência não provém mais de Deus, mas sim do Inferno. Portanto, eu e todos os anjos que me seguiram ainda continuamos iguais. E caso queira partilhar dessa nossa dádiva, é só jurar lealdade a mim.
— Não, obrigado. — e não resiste em perguntar: — Você sabia que Deus morreria?
— Sim. — responde. — Fiquei sabendo disso através de um Ofanim que me seguiu. Hoje ele tem seu próprio séquito de anjos caídos e demônios. Você também pode ter o seu, se assim quiser, é claro.
— Porque Lúcifer está tentando Miguel desta forma? — pensa Surya. — O que ele trama através desse sorriso amigável? Se eu ainda pudesse ver suas reais intenções através de sua aura, mas agora isso é impossível. Terei de esperar para ver se ele mesmo revela...
Nisso, a chuva de anjos enfim termina e as nuvens que banhavam a terra de sangue, cessam.
— Lúcifer! — chama Belial se aproximando. — O que está tramando? Você não viria aqui apenas para ajudá-los. Você não é tão prestativo assim.
— Se você não sabe, Belial, Miguel é meu irmão gêmeo. E eu vim por causa dele. Protegê-lo é uma das minhas principais funções nesse momento. Afinal, os irmãos servem para isso, não é verdade? — e olha de canto para Miguel.
— Não Lúcifer — fala Belial —, você não é tão benevolente assim. Suas atitudes sempre possuem alguma tramóia por trás. Você não dá ponto sem nó. Eu lhe conheço muito bem.
— Não é porque dividimos o Inferno que você pode achar que me conhece. Eu também possuo um coração, às vezes pode até parecer que não, mas no fundo eu sou um ser bastante emotivo.
E então ele estala os dedos e o chão começa a tremer, o som de um exército marchando ao longe pode ser ouvido. E o vento se torna mais forte e irregular, como se soprasse de todas as direções.
Belial inclina levemente a cabeça e constata:
— Você trouxe o seu exército.
— O que seria de um homem como eu sem os seus súditos.
Em segundos, o céu está abarrotado de anjos caídos que mais parece um gigantesco enxame de abelhas. Suas asas batendo freneticamente geram um som ensurdecedor. Das ruas, verte demônios humanóides e criaturas com mais de três metros de altura, todas carregando armas brancas e escudos.
Gabriel observa as criaturas gigantes e recorda quem são.
— Os Nephilins. — conclui.
— Exato. — responde Lúcifer. — Nem todos morreram. Antes de vocês Arcanjos matarem todos, eu consegui levar uma centena deles para o Inferno. Aqui não está nem a metade. Eles se proliferam rapidamente. Parecem até vermes.
Belial olha para os lados e diz:
— Pretende mandá-los nos enfrentar?
— Se for preciso, sim. — responde. — E acredite no que digo, centenas deles possuem uma força quase igual a minha. Então eu acho que você não irá querer que eu os mande atacar, certo? Você e esse Cavaleiro não resistiriam a um exército de mais de milhares.
— Se você tem tanta certeza da sua vitória, porque não faz isso e se livra de nós? Com isso você acabaria com o Apocalipse.
— Essa não é minha função. Eu estou aqui apenas para observar. Eu não sou uma peça nesse tabuleiro.
— Você é um jogador. — observa Surya.
— Exato, minha pequena Querubim. E se querem minha ajuda para fugirem daqui, esse é o momento.
Gabriel dá as costas a eles e sai caminhando.
— Eu me nego a receber ajuda sua. O dia que eu me aproximar de você será para matá-lo e não para pedir ajuda.
Lúcifer sorri e Miguel diz:
— Eu aceito. Tire-nos daqui.
— Alguém sensato. Eu sabia que você era diferente deles.
— Mas não pense que por isso estarei aceitando o seu convite. Só quero a sua ajuda para tirar meus amigos daqui.
— Eu lhe entendo, meu irmão. Mas não esqueça que ficará me devendo um favor. — e estende a mão para Miguel.
E nisso, Miguel recorda da conversa que tiveram no topo do prédio. “Quando a hora chegar você entenderá”.
— Então essa é à hora que ele me falou daquela vez? — pensa. — Mesmo se for, não tenho alternativa senão aceitá-la. — e estende a mão para Lúcifer.
Os irmãos apertam as mãos e o pacto está selado. Lúcifer não informou o que é, mas vindo do Rei dos Caídos pode ser qualquer coisa. E com um sorriso maléfico, Lúcifer, Miguel e outros desaparecem diante dos olhos de Belial e Yulia. Os exércitos de anjos, demônios e Nephilins também desaparecem. Os Arcanjos foram salvos pelo Senhor do Inferno, algo que provavelmente nem eles mesmo pensaram um dia que poderia acontecer, mas de fato acabou de acontecer. Para onde eles foram é mistério, nem mesmo Belial conseguiu sentir a aura de Lúcifer após seu desaparecimento. Mas isso não o impedirá de revirar o planeta e o Inferno atrás dos ex-Arcanjos. Pois ele também possui um exército de demônios, e talvez mais poderosos que os de Lúcifer. Mas o Rei dos Caídos é esperto o suficiente para saber disso. E onde quer que esteja, está com certeza tramando uma saída para isso.

FIM DA PRIMEIRA PARTE...

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Um Mundo em Caos - 40


Como dois jatos supersônicos, Miguel, carregando Jennifer nos braços, e Raguel, voando ao seu lado, cruzam o Oceano Atlântico rumo à Rússia. Ao chegarem a Europa, são obrigados a desviarem seu caminho devido à alta radiação que está sendo carregada pelos ventos.
Vindo de Roma, o homem de vestes negras é o primeiro a chegar à Rússia. Ele cruza a fronteira rompendo a barreira do som e em segundos, é enviada uma dezena de aviões da Força Aérea Russa ao seu encalço. Quando os aviões o encontram, seus pilotos não acreditam no que vêem. Um homem voando acima das nuvens e com dois pares de asas sob suas costas? Só pode ser ilusão, pensam eles. Mas a verdade é que não é ilusão ou delírio. O homem que cruza os céus na mesma velocidade dos mais modernos jatos supersônicos é um Arcanjo, um ser dotado de divindade. Com um aperto de botão, vários mísseis são lançados contra ele. O Arcanjo se esquiva de cada um dos mísseis e ataca os aviões com uma fúria avassaladora. Ele rasga a fuselagem com as mãos e arranca as asas e os motores, os jatos despencam dos céus e explodem ao atingirem o solo. E quanto mais adentra a Rússia, mais artilharia encontra pelo caminho.

Palácio da Primeira-Ministra, Moscou.
Em frente ao palácio, a primeira-ministra Yulia, conversa com um homem africano alto, com cerca de um metro e oitenta de altura, muito forte. Seus cabelos são negros, lisos e bem compridos, sua pele é escura e seu olhar mostra-se atento a tudo e sua expressão é séria. Ele usa uma armadura reluzente e em uma das mãos carrega uma lança.
— Os Arcanjos estão próximos? — pergunta Yulia.
— Sim — responde —, mas não se preocupe que irei lhe proteger de qualquer investida da parte deles. E também não acredito que todos consigam chegar até aqui. Deixei dois demônios de minha total confiança à espera deles. E quando o seu poder for liberado com o soar da primeira trombeta, eu e meus caídos iremos assolar esse planeta com a total destruição de suas principais fontes de energia.
— Fico feliz em ouvir isso, Belial, e tenho certeza que você irá cumprir com a sua palavra. — e olha para os lados procurando algum sinal dos Arcanjos. — E pode ter certeza que também cumprirei com a minha parte do acordo. Só ainda não entendi porque o odeia tanto.
— É uma longa história. Mas deixemos isso para depois que tudo estiver acabado.
— Está certo. Então vamos apenas apreciar o momento que se aproxima.
— Hummm... Parece que chegaram ao meu primeiro caído. — comenta Belial.

Miguel e Raguel cruzam as fronteiras da Rússia, e avistam ao longe, uma figura encapuzada, com gigantescas asas negras. Eles param em pleno ar e ficam a observar a criatura.
— Parece que já nos esperavam. — comenta Raguel. — A linha de frente já está a postos.
— Sabe quem é ele? — pergunta Miguel. — Eu nunca vi esse demônio antes.
— É Beliel, o antigo rei do Inferno. — responde. — Camael e eu o enfrentamos a mais de dois mil anos e desde então ele estava desaparecido. Só gostaria de entender porque ele está aqui.
— Demônios associados aos Cavaleiros? — supõe Jennifer.
—Pode ser, mas com qual intenção? Eles não têm nada a ganhar com isso. — fala Raguel.
— A não ser que haja mais alguém por trás. — fala Jennifer. — Eu até pensei em uma criatura, mas não consigo ver seus propósitos em tal ato.
— Lúcifer? — pergunta Raguel.
Jennifer assente com a cabeça em sinal positivo.
— Não creio que meu irmão se associaria a eles. — responde Miguel. — Ele teria muito mais a perder do que ganhar.
— Pode ser. — fala Raguel. — Mas vindo dele eu não duvidaria de nada. O Rei Caído é traiçoeiro.
— Eu tenho certeza que ele não está por trás disso. Ele almeja muito mais do que uma Terra devastada. — justifica. — Ele quer um reino, não um monte de entulhos.
— Você o conhece melhor que nós. — reconhece Raguel. — Talvez tenha razão.
— Pode acreditar nas minhas palavras, eu sei o que estou falando. E tenho uma suspeita de quem possa ser. E se for quem eu estou pensando, nós três juntos jamais conseguiremos derrotá-lo.
— E quem é? — pergunta Raguel. — É demônio ou...
Nisso, a criatura se lança em vôo e pára bem em frente ao trio.
— Resolvi vir até vocês já que não param de conversar. E eu me pergunto se estão conversando sobre a minha pessoa, ou sobre quem irá me enfrentar? Hummm?
— Nem uma e nem outra. — responde Miguel. — Demônios são tão insignificantes que nem perdemos nosso tempo conversando sobre vocês. Temos assuntos melhores para debater.
— Estamos no fim dos tempos e você sempre arrogante. — comenta Beliel. — Mas uma nova era vai começar e não haverá lugar para vocês. Seremos apenas nós demônios.
— Você acha mesmo que os Cavaleiros do Apocalipse deixarão sobrar alguma coisa? Quando eles surgem não sobra nada, essa é a profecia. — fala Raguel. — E ao final de tudo eles voltam ao pó.
— Vocês não sabem da missa a metade. E em breve começará a chuva e vocês entenderão o que eu estou falando. Por dois mil anos eu esperei ansiosamente por esse momento e vou arrancar as asinhas de vocês e depois assistirei de camarote o que está por vir. O céu irá cair e não haverá nada que vocês possam fazer para evitar isso.
— Do que você está falando? — Pergunta Raguel.
— Cheguem aonde vocês querem ir e saberão. — responde Beliel. — Da minha parte as informações cessam por aqui.
Raguel olha para Miguel e diz:
— Não podemos ficar perdendo tempo aqui. Nosso tempo é curto e precisamos impedir o Cavaleiro. Vocês seguem em frente que eu me encontro com vocês em seguida.
Beliel nada diz e apenas sorri.
— Tem certeza? — pergunta Miguel.
— Tenho sim. — responde. — Eu dou conta desse estorvo. E sozinha eu luto melhor. Você sabe disso.
— Está certo. — concorda Miguel. — Mas mesmo assim, se cuide.
— Vou me cuidar. Agora vão. — sorri. — Já estão me atrapalhando.
Miguel abre as asas e Jennifer sorri para Raguel. Como um piscar de olhos, Miguel sai voando dali rompendo a barreira do som e deixando um rastro estrondoso por onde passa.
— Agora somos apenas você e eu. — fala Beliel. — E assim como há dois mil anos atrás, irei lhe espancar, só que desta vez não terá a ajuda daquele anjo intrometido. E então irá morrer.
— Ah, cale a boca! — fala Raguel, golpeando o rosto de Beliel.
O estrondo do golpe afundando o rosto de Beliel é ouvido longe. Beliel é lançado em direção ao chão e Raguel voa em direção a ele e na queda, o agarra pelas asas.
— Me solte! — esbraveja Beliel.
— Eu vou lhe soltar, mas antes vou fazer algo que há anos desejo.
Raguel apóia os pés nas costas do demônio e puxa suas asas para trás. O som de carne se rasgando e ossos se partindo é ouvido. Beliel urra de dor e com o rasgar de carne, suas asas são arrancadas e ele despenca no ar. Uma trilha de sangue vai ficando para trás. Com um sorriso de satisfação, a mulher-Arcanjo observa a queda do demônio rumo ao solo. Como um pedaço de carne, o demônio atinge o chão abrindo uma cratera. Sangue e fezes espirram para todos os lados. Raguel desce em direção a Beliel como um falcão ao ver a presa caminhando em meio ao campo. Ela pousa ao lado dele e fica observando o corpo destroçado do demônio.
— Não era bem isso que você esperava, não é? Mas eu mudei muito nesses dois mil anos. Naquela época eu era apenas um anjo em começo de vida e você era o Rei do Inferno — recorda —, hoje sou um Arcanjo e você não é nada. E assim morrem os orgulhosos, numa poça de sangue e fezes.
Raguel joga as asas do demônio no chão e abre suas asas. E quando vai sair voando, o demônio balbucia:
— Você está orgulhosa desta vitória, certo? Mas a derrota de vocês será extremamente dolorosa e eu vou...
— Você não vai nada, pois está morto. E eu não sei o que vocês estão tramando, mas iremos impedir o que quer que seja. — e chuta uma pedra sobre o corpo do demônio. — Olhando para você, eu não sei se sinto pena ou nojo. E não sei se deixo você apodrecendo assim ou se jogo terra sobre você para dá-lo um enterro decente... Às vezes eu me odeio por ser tão certinha.
Raguel junta um punhado de terra no chão e joga sobre o corpo de Beliel.
— Você não merece, mas eu vou enterrar seu corpo. Eu fui ensinada que todos merecem um enterro digno, mesmo que seja um demônio.
Raguel se agacha e passa a jogar punhados de terra para dentro da cratera.

Miguel segue voando sobre os céus da Rússia quando uma criatura alada de longos cabelos negros se alinha ao lado dele. Miguel olha para o lado e uma mulher de pele escura, olhos rajados de vermelho e dentes afiados, voa na mesma velocidade que ele. Jennifer a observa por alguns segundos e pede para Miguel pousar. Ele pousa suavemente e ela dá alguns passos para longe dele e diz:
— Me deixe aqui. Você é o único que pode deter esse Cavaleiro do Apocalipse! Eu sei que posso encarar esse demônio! Vá, eu ficarei bem.
— Não posso lhe deixar sozinha aqui. — fala olhando para cima, onde a mulher-demônio está planando bem acima deles. — Não posso sequer pensar na possibilidade de lhe perder. Eu a enfrentarei.
— Você não pode.
— Como assim? Não posso?!
— Ela é o demônio da sedução, seu nome é Naamah. — responde. — Já li sobre ela em uma das bibliotecas de Constantinopla. E você sendo homem cairia no jogo dela. Por isso somente eu posso detê-la. Entendeu?
— Entendi sim. Mas não quero que você fique. Ao contrário de nós, você é totalmente humana. Que chances você teria contra um demônio? Há uma diferença muito grande de força entre vocês. — alerta.
— Mas você deve me deixar aqui. — fala, determinada. — Se existe destino, esse é o meu. Eu preciso fazer algo que me traga orgulho novamente, eu preciso desse momento para mim. Tente me entender. Na minha cabeça, a era de glória dos deuses está bastante viva. A cada segundo eu me lembro de mais feitos maravilhosos. Eu preciso lutar sozinha.
— Mas eu não quero. — ele se nega mais uma vez em aceitar.
Jennifer o abraça fortemente e diz em seu ouvido:
— Eu não vou perder meu querido. E lhe encontro onde você estiver, é uma promessa. E você sabe que eu jamais quebrei uma promessa que fiz.
— Eu sei. E entendo o que está me dizendo, eu só não queria lhe deixar, mas vou aceitar o seu pedido. — e aconselha: — Quando estiver lutando, não hesite em matá-la, pois ela não hesitara em fazer o mesmo com você.
— Vou lembrar do seu conselho quando a hora chegar. — e sorri. — Agora vá. Uma contenda me espera aqui.
— Então eu te espero no Palácio da Primeira-Ministra para comemorarmos a nossa vitória.
Miguel a beija na testa e alça vôo passando ao lado da mulher-demônio, e desaparece no azul do céu. Jennifer fica encarando a mulher por um tempo e esta desce em alta velocidade e pousa ao lado da ex-deusa.
— Então quer dizer que você não possui mais nada de especial. — fala Naamah. — É apenas uma simples humana hoje em dia.
— Simples eu não diria. — rebate. — Passei meses lutando contra criaturas horrendas e homens muito mais fortes que eu e sobrevivi a cada um. Acho que se eu fosse simplória não estaria prestes a lutar contra você. — justifica.
— É verdade. Mas isso não a qualifica a enfrentar demônios. E ter pedido para seu namorado Arcanjo ir embora foi um grande erro da sua parte.
— É o que estamos prestes a descobrir.
— Essa luta não vai durar um minuto. — e as asas da mulher são recolhidas ao corpo de forma grotesca. Os ossos vão se quebrando e as asas vão murchando até virar uma gosma negra fétida que é sugada pelo corpo. — Seria covardia demais lutar com o auxilio das minhas asas, vamos deixar essa luta de igual para igual. — fala sorridente.
— “Igual para igual”?! — pensa Jennifer. — Acho que ela quis ser sarcástica. Mas não posso ficar me perdendo em pensamentos, a qualquer...
Nisso, a mulher ataca lateralmente com uma cotovelada, Jennifer consegue defender e contra-ataca com um chute. Naamah salta para trás, escapando do alcance do golpe e diz:
— Gostei de você. Quase me acertou. Acho que será divertido! — seu tom de voz é esfuziante.
Naamah ataca Jennifer com um chute, mas esta se abaixa, e o golpe passa em branco. Jennifer sobe com o punho em riste preparando um gancho. Naamah segura a mão dela e sorrindo a golpeia com um chute no flanco esquerdo. Jennifer solta um leve gemido e envolve a perna direita de Naamah com o braço esquerdo e usando o braço direito desfere dois socos na perna da mulher. Naamah cai no chão e Jennifer se joga sobre ela e começa a golpeá-la com socos no rosto sem parar. Sangue negro espirra sujando o rosto e as roupas de Jennifer. Jennifer a golpeia como se estivesse possuída por uma fúria sobre-humana. Sangue cada vez mais espesso respinga no rosto de Jennifer. Mas nisso, Naamah agarra os braços de Jennifer e a joga para o lado. Jennifer rola pelo chão de terra batida e com um movimento rápido de pernas se ergue do chão.
— Era para ela estar desacordada. — pensa Jennifer, limpando o rosto que está sujo de sangue.
— Pensou que seria tão fácil assim? — fala Naamah se erguendo do chão. Seu rosto está todo deformando e sangue negro escorre pelos cortes abertos. — Agora é que a verdadeira diversão começa.
Jennifer nada responde.
A fisionomia de Naamah muda, seu rosto adquire feições de loucura e da cintura ela desenrola duas finas cordas com uma estrela de quatro pontas em cada. As estrelas brilham de tão afiadas.
— Essas duas cordas são meus brinquedos favoritos. Está vendo estas estrelas em suas pontas? Elas cortam carne como se fosse faca quente na manteiga. E estão famintas pelo gostinho do sangue humano, pois já faz séculos que elas não sabem o que é isso.
Jennifer apenas encara Naamah enquanto esta fala.
— Ai, ai. — e sacode a cabeça. — Você podia ser mais falante. Cansa ficar falando sozinha.
— Não tenho nada para falar. — e pensa: — Será que o Miguel já está enfrentando o Cavaleiro? Não posso ficar pensando nisso, tenho um demônio na minha frente e não posso perder o foco.
— Pffffff. — suspira. — Chega de brincadeiras. — e começa a girar as cordas sobre a cabeça.
Jennifer assume posição de combate e Naamah arremessa as cordas em alta velocidade na direção dela. As estrelas viajam numa velocidade que os olhos humanos não conseguem sequer enxergar e cravam nos ombros de Jennifer ficando com apenas uma das pontas de fora.
— Argh! — Jennifer solta um urro de dor e arqueia o corpo para trás, esticando as cordas.
— Dói, não é? Mas isso é apenas o começo do seu martírio. Você disse para o Arcanjo que esse era o seu destino e que você precisava lutar sozinha. Um erro em minha opinião. Não existe destino, cada um faz o seu caminho. E lutar sozinha comigo foi burrice. Eu sou um demônio, muito superior em força aos humanos. Nem todos os demônios são poderosos, eu nem sou uma das mais poderosas. Existem demônios que são dez vezes mais fortes que eu e outros ridiculamente fracos. Mas os fracos não sobem para o campo de batalha, eles são usados para nos entreter e cuidar de certos afazeres. Talvez você possuísse alguma chance se tivesse cruzado com esses demônios mais fracos, mas eu, eu sou muito mais forte que você, e isso significa que você irá morrer pelas minhas mãos. E acredite em mim, será melhor assim. Você não irá querer ver o que está para acontecer. A chuva será sangrenta.
— Chuva?! Será mais um dilúvio? — pensa intrigada em meio à dor que sente. — O que você está querendo dizer com chuva? — sua curiosidade é maior que a dor e o sangue que escorre dos dois ferimentos.
— Isso é um segredo que só nós, os demônios do Apocalipse, sabemos.
— Demônios do Apocalipse?!
— Isso mesmo. — responde. — Apesar de todas as informações que hoje existem, há certas coisas que ficam ocultas por milênios. Nós os demônios do Apocalipse, só surgimos quando o primeiro Cavaleiro desperta, somos uma espécie de escudo deles. — explica. — Pois até o soar da primeira trombeta ele é tão humano quanto você. Mas após isso, ele desperta o seu verdadeiro poder e a nós é dado o poder de destruir a Terra como bem entendermos. Claro que temos um líder que barganha com esse Cavaleiro certas concessões para termos privilégios. E foi o que ele fez. Só estamos esperando o soar da primeira trombeta para pormos nosso plano em curso.
— E o que vocês barganharam? — pergunta.
— Segredo, minha querida, segredo. — responde. — Acho que já falei demais. Está na hora de acabarmos com isso.
E começa a puxar as cordas, o que conseqüentemente puxa o corpo de Jennifer junto. Jennifer segura as cordas e força seu corpo para trás. Mas a mulher-demônio é muito mais forte que ela e com um forte movimento de braços, joga Jennifer para frente que cai de bruços no chão. Naamah olha para os lados e avista algumas árvores após uma rodovia de asfalto. Ela passa a arrastar Jennifer e atravessa a rodovia. Jennifer se debate tentando resistir a força de Naamah, mas nada consegue fazer.
— Pare de tentar resistir! Eu já lhe disse que sou muito mais forte que você! Esse seu esforço é inútil!
— Nada que eu faça é inútil! — rebate. — Não vou deixar que você me mate!
— Não há nada que você possa fazer para impedir isso. Nem que você passasse mil anos batalhando sem parar, conseguiria me derrotar. Seus esforços são uma perda de tempo, menina!
Jennifer nada responde. Naamah se aproxima de uma árvore alta e salta sobre um galho bem grosso e puxa Jennifer em direção a árvore a deixando de costas para o tronco.
— Sabe o que é legal de ser um demônio?
— Serem feios?
— Heheh. Tentando ser engraçada antes da morte? Mas lhe digo que não é isso. É que somos cheios de surpresas.
Naamah leva uma das mãos à barriga e uma gosma negra começa a sair e a tomar a forma de uma espada negra extremamente afiada. A mulher-demônio segura o cabo da espada e a puxa como se estivesse embainhada. A lâmina brilha em contato com a luz do sol e com um rápido movimento, Naamah atravessa o tronco da árvore com a espada e perfura as costas de Jennifer, fazendo a ponta da espada sair na barriga dela. Sangue quente jorra molhando a terra e as raízes da árvore.
— Esse golpe foi fatal. — avisa, retirando a espada e a jogando no chão. — Só que você não irá morrer agora — explica —, mas ficará agonizando enquanto a sua vida vai se esvaindo diante dos seus olhos. E eu vou aproveitar para me divertir enquanto isso.
Naamah dá a volta em torno da árvore e pára em frente à Jennifer.
— Você golpeou meu rosto sem se preocupar em como eu ficaria, então farei o mesmo com você. E a diferença é que eu sou muito mais forte e o estrago será bem maior.
Naamah começa a socar o rosto de Jennifer sem dó. Ao primeiro golpe, o sangue já espirra no rosto da mulher demônio que lambe os lábios sujos com o morno liquido que corre nas veias dos humanos.
— O seu sangue tem um gosto bem diferente. — comenta. — Deve ser devido a sua linhagem. É tão exótico... Tão, delicioso.
E os golpes são desferidos com mais selvageria. Os ossos do rosto de Jennifer começam a se partir e a perfurar a carne, abrindo verdadeiras crateras no rosto dela, onde o sangue escorre em profusão. Naamah se delicia com o que está acontecendo e em aparente transe, diz:
— Nós demônios iremos dominar esse mundo! Seremos os verdadeiros donos dele! O Céu irá cair aos nossos pés! Seremos reis!
Em meios aos golpes, Jennifer balbucia:
— Sua cobiça vai acabar te matando mais cedo do que imagina.
— Não diga bobagens! — exclama. — Nós vivemos na mais pura escuridão até esse momento e nada, simplesmente nada, irá impedir de caminharmos livremente por essas terras poeirentas!
E golpeia Jennifer com vários socos.
— Você não nos conhece. — murmura. — Eu posso até morrer aqui, mas com certeza o Miguel e seus amigos irão exterminar você como o lixo desprezível que é! — ruge, puxando suas últimas forças. — Vocês não merecem sequer pisar esses pés imundos nesse mundo maravilhoso!
— Tola! — esbraveja, caminhando em direção a espada. — Cansei de seus insultos. — e agarra a espada no chão. — Irei cortar a sua cabeça e dar fim a essa sua vida medíocre! Não sei o que acontece quando se mata uma ex-deusa, mas você irá descobrir isso para mim. — e pára em frente à Jennifer com a espada erguida na diagonal.
Jennifer fecha os olhos e balbucia:
— Adeus Miguel. Te amo...
Sangue explode em todas as direções e ossos e pedaços de carne voam pelo chão. Jennifer é banhada pelo sangue da mulher-demônio e ao abrir os olhos, vê Raguel parada bem na sua frente.
— Raguel...
— Cheguei bem a tempo de salvar o seu pescoço. — fala Raguel. — Se eu não conseguisse o Miguel não iria me perdoar. Agora vamos soltar você e dar um jeito de curar esses seus ferimentos, pois o seu rosto está uma lástima. — comenta.
Jennifer sorri com o comentário da amiga.
— Para eu tirar essas estrelas do seu ombro será dolorido. — avisa. — Consegue agüentar?
— Sim. — responde sussurrando.
— Ok.
Raguel segura as cordas e as puxa, fazendo as estrelas rasgarem a carne de dentro para fora e saírem de onde estavam. Sangue espirra e Jennifer cai de joelhos no chão. Raguel a envolve em seus braços e um brilho incandescente envolve as duas. As árvores ao redor são queimadas devido ao calor gerado e se desmancham em montes de cinzas. O brilho vai diminuindo aos poucos e ao cessar, Jennifer está sem nenhum ferimento, mas ainda continua suja com o próprio sangue e com o sangue de Naamah.
— Como está se sentindo? — pergunta Raguel.
— Como se eu nunca tivesse apanhado tanto. — responde sorrindo e se erguendo do chão. — Obrigada.
— De nada. Acha que está preparada para talvez outra luta?
— Com certeza. — responde determinada. — Cada luta é um aprendizado diferente.
Raguel sorri e diz:
— Então vamos ao encontro de Miguel. Com certeza ele já deve ter chegado lá.
— Se ele já chegou, deve estar enfrentando outro demônio, o líder desses que enfrentamos.
— Como assim?
— Ela me falou que eles se chamam demônios do Apocalipse e que existe um líder que barganhou com esse Cavaleiro alguma coisa. — responde. — Mas ela não me disse o que. Mas logo depois ela falou que eles seriam os reis desse mundo. Deve ter alguma ligação.
— Eu nunca ouvi falar sobre eles. — comenta. — Eu nunca soube da existência de tais demônios. Nada fica oculto dos mais sábios do Paraíso e nunca ninguém me falou nada.
— Ela disse que certos segredos ficam ocultos. — acrescenta.
— Não estou gostando nada disso. — e olha em direção aonde a emanação da aura de Miguel vem. — Pelo menos ainda sinto a aura do Miguel intacta. Mas também sinto uma aura bem fraca, quase se esvaindo, bem próxima da morte. Só que não consigo identificar de quem é.
— Então vamos para lá. — fala Jennifer.
— Certo!
Jennifer envolve os braços ao redor do pescoço de Raguel e esta abre suas asas, e um estrondo é seguido após seu vôo.