Licença Creative Commons
Armagedon - Um Mundo em Caos / Final Odyssey de Fernando Athayde dos Santos é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Vedada a criação de obras derivadas 3.0 Unported.
Permissions beyond the scope of this license may be available at http://ummundoemcaos.blogspot.com.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Um Mundo em Caos - 03

O dia está amanhecendo e Miguel acorda com uma onda de barulhos vindos da rua. Ele está deitado em um sofá próximo à cama onde Raguel ainda dorme. Sonolento, ele levanta e caminha até a janela para averiguar o que são esses barulhos que o tiraram de seu sono. Ao olhar pelo vidro, se depara com uma visão simplesmente aterradora, inimaginável para ele até então. Centenas de zumbis cambaleantes estão amontoados em frente à casa, e outros mais seguem o mesmo caminho. As grades que compõem a cerca que protegem o pátio antes eram retas, agora estão inclinadas em direção a casa, Miguel parece sentir que as ponteiras das grades estão apontando para ele.
Os grunhidos que antes eram quase imperceptíveis, agora se tornam altos, os zumbis sentiram a presença dele na casa, ou mesmo viram ele no alto da janela. Para quem ouve parece uma suplica de dor, os grunhidos se assemelham a gemidos, um som rouco devido à podridão das cordas vocais. Miguel então sai da janela e caminha a passos rápidos em direção a cama chamando por Raguel.
— O que houve? — pergunta ela ainda abrindo os olhos.
— Estamos cercados. — responde ele com um tom de voz baixa.
— Como assim?
— Ouve o barulho vindo da rua. — Miguel fica a olhar para Raguel e quando ele percebe a feições do rosto dela mudarem, ele continua, — Há centenas de zumbis amontoadas aqui em frente, a única coisa que nos separa deles são as grades do muro.
— Não pode ser! Como eles sabem que estamos aqui? — indaga ela levantando. — Não havia nenhum nos arredores quando chegamos ontem à noite.
— Não sei, mas o fato é que nos encontraram e agora precisamos sair daqui.
Então ela caminha até a janela e vê com seus próprios olhos aquela multidão de mortos-vivos que se aglomeram cada vez mais em frente às grades da casa. Ela sente um frio na espinha e a sensação de como se eles a fitassem com seus olhos mortos sedentos para devorarem a carne dos ocupantes da casa.
— O que vamos fazer? — pergunta ela colocando as mãos no vidro da janela.
Miguel se aproxima dela e responde: — Achar uma maneira de sairmos vivos daqui, porque essa grade não vai agüentar muito tempo e logo eles invadirão a casa. — então ele caminha até outra janela e fica olhando para o portão, e ­— Acho que tem uma maneira de sairmos daqui. Mas vou precisar da sua ajuda. — conclui olhando para Raguel.
— E o que você tem em mente?
— Reforçar o carro — e após uma pequena pausa conclui, — e passar arrancando o portão e atropelar tudo o que cruzar a nossa frente.
— E como pretende fazer isso?
— Reforçando a frente do carro. Eu vi vários pedaços de madeira, ferro e outras coisas na sua garagem. Então o que eu pensei foi — fala Miguel pegando um papel e uma caneta e começando a desenhar conforme vai falando. — Vou abrir quatro buracos no capô e colocar quatro pedaços de madeira em vertical, exatamente como desenhei aqui. Depois pegarei outras duas madeiras um pouco maiores e vou pregar sobre essas na horizontal, entendeu?
­— Sim. — responde ela.
— Então vou abrir um buraco de cada lado do pára-choque e vou passar uma madeira e pregar mais duas na horizontal em direção a frente do carro. Tá dando pra entender direitinho no desenho? — ela responde que sim e ele continua, — Feito isso, vou usar a madeira de cima da sua mesa da cozinha e pregar nessa quatro madeiras que estão na horizontal e criar uma espécie de parede.
— E acha que isso vai funcionar?
— Tem que funcionar. — responde largando o papel e a caneta na escrivaninha. — É a única alternativa que temos.
— E quando vai começar a fazer isso?
— Agora mesmo.
— Então espera eu trocar de roupa que eu vou te ajudar. De pijama fica meio complicado.
— Espero lá em baixo, vou ir procurando as coisas que eu preciso e já aproveito pra dar comida para o filhote. ­— fala saindo do quarto.
Miguel desce até a garagem e o filhote vem correndo brincar aos seus pés, ele brinca um pouco e aproveita para encher um potinho de ração. O filhote pára para comer e Miguel começa a procurar por um martelo. Ele acha então o martelo sobre uma estante e o separa colocando em cima do capô do carro. Então ele olha para os lados e pensa: ­— Preciso de uma serrinha para poder cortar o capô.
Raguel já trocou de roupa e está em frente ao espelho arrumando o cabelo: ­— O mundo em ruínas e eu aqui cuidando do meu visual. Como se alguém fosse perceber com tudo isso que está acontecendo. — ela arruma o cabelo de forma que fica com uma pequena franja cobrindo parte da testa e o restante do cabelo penteado para trás parecendo uma onda de fogo descendo por suas costas. Ela desce as escadas e então caminha até a garagem e encontra Miguel rabiscando o capô do carro com um giz branco. — Ainda desenhando? — pergunta.
— É para cortar de forma correta e não cometer nenhum erro. — responde sem tirar a atenção do que está fazendo. — O meu projeto precisa ser firme para não ceder, então não posso deixar folgas e nem falhas. A nossa sobrevivência depende disso.
— Hummm, então no que posso ajudar? — pergunta colocando a mão sobre o ombro dele.
Ele vira-se para ela e notando a mudança no penteado diz: — Ficou muito bonita com esse penteado, te deu um ar de inocência. E claro, seus olhos verdes ficaram ainda mais belos.
— Obrigada. — responde e logo em seguida pensa: — E eu achando que ninguém notaria uma diferença sequer em mim não importando o que eu fizesse. Ele parece tão diferente de todas as pessoas que eu conheci quando o mundo ainda era normal. O olhar dele possui um carinho to grande... — então ela tem seus pensamentos invadidos por uma pergunta: — Está tudo bem? — A pergunta a tira do fundo de seus pensamentos e a faz acordar: — Tudo bem. Só estava pensativa.
— Quer compartilhar comigo o que estava pensando? — pergunta. — É que lhe perguntei três vezes se estava tudo bem.
— Não era nada importante.
— Está certo. — então ele sorrindo diz: — Quer me ajudar?
— É claro! — responde ela com um sorriso no rosto. — O que eu posso fazer?
— O que você sabe fazer?
— Muitas coisas. Sempre gostei de acompanhar meu pai nas reformas aqui de casa ou então quando ele resolvia botar a mão na massa nos projetos que ele aceitava.
— O que ele fazia?
— Ele é engenheiro civil e arquiteto. — responde. — Trabalhava na construção civil. Era dele o projeto do shopping aqui da cidade. Uma pena não ter dado tempo de concluir. Iria ficar muito bonito.
— E você ficou bem quietinha quando eu estava fazendo aquele desenho tosco.
— Heheh... mas ficou bom. A idéia era sua, como eu iria me intrometer?
— Idéias são bem vindas e sempre que você tiver uma eu quero que me conte, tá bom?
— Tá.
— Nós somos uma equipe agora, eu poderia dizer uma dupla, mas nos considero muito maiores que apenas duas pessoas. — fala Miguel com as mãos nos ombros de Raguel. — Nós somos o maior time que existe no mundo! Eu e você!
Raguel ouve atentamente a cada palavra dita por Miguel e sente sua vontade de sobreviver renovadas. No interior de sua alma ela sente que enquanto os dois permanecerem juntos serão invencíveis. Então ela sorri para Miguel o abraçando forte e bem próximo de seu ouvido diz:
— Você é incrível. Muitas vezes pensei em desistir, em deixar meu corpo sucumbir a escuridão que o mundo oferece hoje. Mas desde que nos conhecemos sinto minha força de vontade crescendo, meu instinto de sobrevivência se renovando. Vamos terminar de construir o seu projeto e destruir esses zumbis.
Miguel alegremente responde:
— Sairemos daqui até o meio-dia.
Os dois então começam a trabalhar de forma árdua na construção do projeto de Miguel. Enquanto Raguel termina de cortar as madeiras, ele já está serrando o capô. Ela então entrega as madeiras para Miguel e ele já as coloca no capô reforçando-as na parte de baixo. Raguel termina de cortas outras madeiras e diz: — Terminei aqui. Vou desmontar a mesa da cozinha e já te trago mais madeiras. — Miguel agora está abrindo os buracos nas laterais do pára-choque e responde: — Ótimo, daqui a pouco vou precisar da madeira que fica em cima da mesa, que eu acho que seria a tampa da mesa, mas não tenho certeza. — Raguel se encaminha para a cozinha e passa a desmontar a mesa. Em alguns minutos a mesa está completamente desmontada e ela passa a levar as madeiras para a garagem. A invenção de Miguel está quase pronta, faltando apenas a tampa da mesa. Os dois então carregam essa parte juntos e alguns minutos depois terminam de montar a tal parede criada por Miguel.
— Conseguimos. — fala Raguel cansada.
— Agora preciso fechar a parte em que quebrei o vidro. Pensei em utilizar aquela grade que está jogada ali no canto. Vou prender ela na porta com bastante arame e poderemos sair daqui.
— Quer ajuda nessa parte? — pergunta Raguel indo buscar a grade. — Tem arame na primeira gaveta do armário.
Miguel pega o arame na gaveta e Raguel entrega para ele a grade. Miguel então abre o porta-malas e diz para ela: ­— Em alguns minutos sairemos daqui, então eu gostaria que você pegasse tudo que julgar necessário levarmos. Porque é bem provável que não mais voltemos aqui.
— Vou pegar algumas roupas minhas e alguns lençóis, cobertores, não quero que passemos frio.
— Certo. Eu vou terminar de arrumar aqui e quando você voltar estaremos prontos para sair.
Eles passaram tanto tempo dentro de casa sem olhar para a rua que nem sequer perceberam que o acúmulo de mortos-vivos na frente da casa e nas ruas próximas chega a quase milhares. Se fosse visto de cima, iria parecer um monte de formigas quando se mexe em um formigueiro. E o número de seres putrefatos aumenta a cada minuto que passa.
Raguel procura por duas malas de viagem e ao achá-las as enche com roupas, lençóis, cobertores e toalhas. Então ela pensa: — Será que não falta mais nada? Acho que não. Isso é tudo que precisamos. — então ela pega as duas malas de viagem e desce rapidamente para a garagem. Miguel já estava com tudo pronto. Estava apenas esperando por ela. — Peguei tudo que precisamos. — diz ela.
Ele coloca as malas no porta-malas e o fecha. Então olhando para ela e pergunta:
— Está pronta para encarar os monstros que nos esperam lá fora?
— Com você ao meu lado estou pronta para encarar qualquer coisa. — responde ela.
— Então vamos abrir a porta da garagem e dar o fora daqui. — fala Miguel caminhando até a porta de ferro da garagem.
Ele destranca a porta e a levanta revelando novamente o mundo lá fora. As grades estão tapadas de zumbis criando um bloco maciço de corpos putrefatos a frente deles. Então Miguel faz sinal para Raguel entrar no carro. Ela entra rapidamente e ele então fica por mais alguns segundos encarando os zumbis e então vira de costas para eles e caminha em direção ao carro. Miguel gira a chave do carro e ouve o ronco subir, ele então engata a primeira marcha e começa a acelerar devagar o carro. Ao se aproximar do portão começa a empurrá-lo para frente e então engata a segunda marcha e pisa um pouco mais no acelerador. O conta-giros sobe para três mil RPM e o portão se rompe com a força do carro e ele passa a empurrar os zumbis. Conforme o carro vai avançando os zumbis vão sendo empurrados para as laterais e alguns caem e as rodas do carro passam por cima. Raguel assustada diz:
— Não parecia tantos olhando da janela hoje de manhã. Será que vamos conseguir?
— Precisamos conseguir. — responde Miguel. — Tente não olhar para eles, feche seus olhos e deixe comigo.
Miguel vai avançando aos poucos e percebe que a tampa da mesa está se rompendo, então pensa: — Por favor, não quebre antes de sairmos daqui. — As mãos dos zumbis tentam atravessar a grade que ele colocou no lugar do vidro e a forçam para dentro. Miguel pisa um pouco mais forte no acelerador e o carro passa a andar mais rápido, mas mesmo assim ele sente o carro ser empurrado pela massa de zumbis a frente. Então ao chegar ao final da rua ele consegue avistar uma clareira entre os zumbis e acelera o carro com tudo o jogando sobre os zumbis. Quando ele consegue chegar a clareira avista uma rua vazia e vira o volante para direita e faz o carro cantar pneus e desaparece em alta velocidade deixando os zumbis para trás.
Então ele olha para Raguel e diz:
— Conseguimos! Deixamos eles para trás!
Ela abre os olhos e ao ver que não há sequer um zumbi em volta do carro, sorri e abraça Miguel com tanta força que ele diz: ­— Tá me sufocando... — Ela sorri e dá um beijo no rosto dele e o agradece por tê-los tirado de lá. Miguel reduz a velocidade do carro e olha para ela e diz que agora eles vão para Canoas em busca dos amigos dele. Que quanto mais pessoas capazes de resistir aos zumbis juntos melhor. E que os amigos dele são pessoas capazes de resistir ao Apocalipse bíblico várias vezes. Ela sorri e diz que se ele está dizendo isso ela acredita e que vai ajudá-lo no que ele decidir fazer. E assim eles seguem rumo a Canoas pela BR 116.

2 comentários:

  1. Po! Ficar de olhos fechados com akeles zumbis sendo estraçalhados? Nem fudendo kkk

    ResponderExcluir
  2. Mas ela é uma menina muito doce que vai todo dia ao bosque cortar lenha para a vovó... ops, isso é outra história... huauahuhauha.

    ResponderExcluir