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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Um Mundo em Caos - 14

— Ei Miguel. — chama Rafael. — O mundo como o conhecíamos não existe mais, isso é fato, a forma para sobreviver daqui para frente será outra. Talvez volte a ser de forma nômade, ou em pequenas comunidades. O que me leva a pensar uma coisa.
— Fale. — diz Miguel.
— O que seremos nessa nova ordem mundial? Nômades ou viveremos em comunidade?
— Você se refere a nós ou fala em âmbito global?
— Me refiro a nós, o mundo é grande demais para eu pensar agora.
— Sinceramente falando eu não sei. No momento somos nômades, isso é o que somos. Mas uma hora teremos que nos fixar num único local. Não da pra passar o resto da vida andando pra cima e pra baixo. Não fomos educados para isso.
— E não é apenas a questão de como fomos educados para viver. — fala Raguel. — Uma hora a comida vai acabar. Tudo tem data de validade. E quando isso acontecer é bom já termos um lugar fixo para viver, pois precisaremos já estar com alimentos prontos para o consumo.
— A Raguel tem toda a razão. — concorda Gabriel. — E uma coisa que precisamos fazer e até agora não pensamos nisso é ir atrás de sementes. Precisamos ir atrás de uma agropecuária. É onde encontraremos todo tipo de sementes.
— Então esta será a primeira missão de vocês quando chegarmos a Porto Alegre. — fala Miguel. — A minha será encontrar meus pais.
— Calminha aí. — fala Gabriel. — É impressão minha ou você está querendo nos dar ordem? Não me lembro de termos colocado você como líder.
— Não estou dando ordem e nem quero ser o líder de ninguém, não tenho perfil de Capitão América para isso. Foi apenas uma colocação. Pois a premissa que me trouxe a este ponto é ir a Porto Alegre encontrar meus pais.
— Porto Alegre é muito grande, você sabe disso, não é? — fala Rafael. — E pelo que eu pude perceber nesse seu pequeno discurso é que você pretende seguir outro caminho. Realmente pretende se separar de nós?
— É o que eu tenho em mente. — responde Miguel. — Mas só enquanto procuro por eles. Não vou passar o resto da minha vida fazendo isso.
— Se você pretende fazer isso eu vou junto. Não deixarei você ir sozinho a lugar algum! — fala Raguel.
— Ihh, parece que você arranjou uma protetora. — fala Gabriel.
— Não é isso. Só não quero que ele tenha que lutar sozinho. Só eu sei pelo que passamos. Só eu vi o que fizeram a ele. Cada soco, cada chute, cada coisa que faziam doía em mim. Eu queria poder dividir com ele a dor que ele sentia. Pegar uma parte dela para mim. Isso se chama amizade, não ser protetora.
Gabriel fica em silêncio e Rafael diz:
— Realmente não sabemos o que aconteceu, pois não estávamos lá, mas pode ter certeza que se estivéssemos gostaríamos de poder fazer a mesma coisa. Somos amigos há anos, não a partir de ontem. Também passamos por muitas coisas juntos, nada nesse nível. Mas passamos. Então não venha querer nos dizer o que é amizade. Esperamos por esse cara para podermos nos reunir novamente e seguir em frente. E é o que estamos fazendo agora. E achou mesmo que o deixaríamos seguir sozinho? Somos uma equipe agora, e equipes seguem unidas em prol do melhor para todos. Podemos fazer o que ele disse seguindo juntos. Seguindo o mesmo caminho. Nada nos impede de mantermos outras funções em segundo plano.
Raguel ouviu tudo o que Rafael falou em silêncio e então quando ele termina de falar ela diz:
— Desculpa. Eu não quis dizer que vocês não são amigos dele. O que eu tentei dizer é que por amizade eu vou com ele até o inferno se for necessário.
Miguel que até então apenas ouvia a discussão decide falar:
— Pessoal, não importa se nos conhecemos há dez anos ou há apenas dois dias, amizades podem ser forjadas em minutos. No nosso íntimo sabemos em quem podemos confiar e em quem não podemos. Simples assim. E eu confio em vocês três sem distinção. Então discussões não vão nos levar a lugar algum, apenas a discórdia. E não precisamos disso. Não agora.
— Desculpa. — fala Rafael. — Eu me excedi. Peço desculpas a todos.
E assim eles seguem viagem rumo a Porto Alegre. Infelizmente a alegria que antes os contagiava agora foi tomada por uma pequena indisposição. Mas nada que abale a amizade deles. E sim algo que os fará pensar um pouco mais antes de falar qualquer coisa ou interpretar o que o outro disse de forma errônea.
Cada vez mais eles se aproximam de Porto Alegre, e agora estão passando bem em frente ao aeroporto Salgado Filho. Miguel então olha para o Laçador e quebra o silêncio dizendo:
— O que acham de pararmos um pouco? Quero esticar minhas pernas. Devido a esse monte de carros na estrada viemos à velocidade de tartaruga e em ziguezague. To me sentindo meio mal com isso.
— Por mim tranqüilo. — fala Rafael.
— Por mim também. — concorda Gabriel.
­— Então vou achar um lugar para estacionar. — fala Raguel olhando para os lados. — Quer saber, vou passar por cima do canteiro e vou parar ali no Laçador.
Ela então corta caminho passando por cima do canteiro central e após desviar de alguns carros, estaciona bem embaixo da estátua do Laçador. Miguel abre a porta do carro e desce.
— Ufa! Minhas pernas agradecem. — então ele caminha até um pouco mais a frente e olha para o céu e encontra uma nuvem que possui um formato bastante familiar para ele. — Jenny, como aquela nuvem se parece com você. Seria você olhando para nós? — ele fica uns segundos em silêncio e continua, — Como é difícil viver sem você. Bem, não que eu não pudesse viver, mas é que eu sequer quero tentar. Desde o dia que nos falamos pela última vez, toda a noite eu sonho com você. Se eu não tivesse sido tão idiota em querer ter ficado sozinho em casa, agora eu estaria te segurando. E não existe nada que eu não faria para poder ter você de volta. Se eu não fosse tão medroso já estaria aí com você. Quando estava no shopping sendo massacrado, por várias vezes desejei que você viesse me buscar. Por isso eu queria tanto enfrentar aquele brutamonte do Astaroth, pois sabia que ele me mataria rapidamente. — ele fica em silêncio por mais alguns segundos e chutando uma pequena pedra segue adiante, — Eu não sei como isso ficou tão louco, mas eu prometo que vou fazer de tudo para acertar as coisas aqui e poder estar com você novamente. Seu amor era incrível, você foi à melhor coisa na minha vida. E eu quero te provar que o meu amor ainda é real, e fazer você sentir o que sinto não importando onde você esteja agora. Eu daria o mundo se você ao menos pudesse voltar para mim. — ele então cai de joelhos ao chão chorando e Raguel se movimenta para ir até ele e Gabriel a segura pelo braço e faz sinal de não com a cabeça. — Tenho tantas coisas a dizer, mas apenas um caminho a seguir. Quero encontrar um caminho que me leve para perto do seu coração novamente. O que posso fazer? Eu queria mais uma chance de dar meu amor a você, porque ninguém neste mundo te ama como eu. Eu volto no tempo, eu imploro, eu suplico, caio de joelhos. Mas eu preciso de você. Porque Deus??? Porque tirou meu bem mais precioso??? Por quê?
Rafael então desce do carro e caminha até Miguel.
— Vamos. Não adianta ficar se martirizando. Eu sei o quanto isso dói. Mas você tem que aceitar isso. Olha quanto tempo já faz. Você precisa seguir em frente.
— Eu não quero! Prefiro ficar parado no tempo. Meu coração quer isso! Eu não agüento mais esconder como isso dói. É algo que está me matando. Tento dizer todos os dias para mim que está tudo bem, que já passou. Mas é mentira! Eu só quero estar com ela!
— Eu tenho certeza que ela não iria querer isso. Ela sempre quis ver você sorrindo, brincando, se divertindo. E não melancólico pelos cantos. Vamos, seja homem e se erga como tal. Seja como a fênix e ressurja das cinzas ainda mais forte.
Miguel então se levanta e diz:
— Eu não sou a fênix, sou apenas um cara que perdeu seu bem mais precioso! Eu quero apenas mo...
Rafael acerta um soco no rosto de Miguel o derrubando no chão.
— Cala a boca!!! Chega de falar besteiras! Você parece uma garota histérica. É assim que pretende ir à procura dos seus pais?
Miguel olha para Rafael e responde:
— Não.
— Então! Levanta desse chão imundo. Pare de agir feito criança e cresça! A gente precisa de você, a Raguel precisa de você mais do que qualquer um de nós aqui. Por você ela enfrentaria o inferno. Pensa um pouco. É assim que você quer que ela te veja? Um chorão que precisa levar um soco na cara todas às vezes que resolve ter um surto de melancolia?
— Nem um pouco.
— Então levanta e se recompõe. — fala Rafael estendendo a mão para Miguel.
Miguel segura na mão de Rafael e este o ergue do chão. Miguel então olha para ele e diz:
— Vai indo que eu já vou.
— Assim espero. — fala Rafael caminhando em direção ao carro.
— Sem você Jenny, eu me sinto tão incompleto. — pensa ele. — Mas vou seguir em frente pelos meus amigos e quando minha hora chegar quero que você venha me buscar. — ele então seca as lágrimas e sorri olhando para o céu.
Miguel caminha de volta para o carro e Raguel pergunta:
— Tudo bem com você?
— Agora sim. — responde ele. — Foi preciso levar um soco para acordar.
— Espero que ele não tenha te machucado.
— Não machucou. Mas eu estava precisando. De verdade. Mas... vamos seguir em frente?
— Esse é o Miguel que eu conheço. — fala Gabriel.
Raguel liga o carro, contorna o estacionamento e segue novamente em direção a Porto Alegre.
Conforme vão se aproximando da estação Farrapos fica mais visível a destruição a qual a cidade foi submetida. A maioria dos prédios se tornou amontoados de pedras e concreto. Zumbis vagueiam por todos os cantos.
— Parece que houve uma guerra aqui. — comenta Gabriel.
— Os militares não pouparam munição quando avisaram que a cidade seria bombardeada. — fala Rafael. — Fizeram uma limpeza.
— Quantos inocentes não devem ter morrido nessa loucura. — fala Miguel.
— Verdade. — concorda Raguel. — Uma insanidade por parte de quem autorizou isso.
Eles seguem adiante e o caminho fica cada vez mais complicado. Os destroços dos prédios invadem as ruas e muitas delas são intransitáveis. A Avenida Farrapos que é a que estão seguindo está abarrotada de carros destruídos e muitos destroços.
— Segue em frente. — fala Miguel.
Raguel é obrigada a dirigir mais devagar e a desviar com mais freqüência dos carros que se tornam grandes obstáculos. Em certos momentos é preciso rodar com o carro inclinado, metade em cima dos escombros e a outra no asfalto.
— Eu acho melhor vocês colocarem os cintos. — fala Raguel. — No caso de acontecer alguma coisa estamos protegidos.
Eles colocam o cinto e mais a frente, a queda dos prédios criou uma montanha bastante inclinada. Raguel acelera o carro e começa a subir a montanha. Quando ela está bem no topo e o carro inclina levemente para descer, eles avistam não muito embaixo uma montanha de corpos. Ela trava o carro e Miguel exclama:
— Mas que merda é aquela?!
­Rafael abre a porta do carro e saindo diz:
— Esses corpos estão sendo trazidos para cá de algum lugar.
— Como assim?! — pergunta Gabriel.
— Vou dar uma descida para ver mais de perto. Me  dêem cobertura.
Gabriel desce pelos escombros bem devagar e lá em cima os três descem do carro e ficam olhando para os lados. Quanto mais Gabriel se aproxima dos corpos, mais insuportável é o cheiro de podridão. Então ele puxa a gola da camisa até a altura do nariz. Ele chuta alguns corpos e pode verificar que vários possuem tiros no coração e ainda estão sangrando. Ele olha para cima e faz sinal para os outros se abaixarem. E nisso tiros atingem o carro e o chão.
— Caralho! — grita Miguel. — É cilada Bino! Corre!
— Miguel?! — exclama Raguel. — Isso não é hora de fazer piadas!
— Eu sempre quis dizer isso. Não podia perder a oportunidade. — fala pegando a arma no banco do carro. ­— Não me censura.
Rafael sobe correndo e diz:
— Eu avistei três pessoas naquele pedaço de prédio à esquerda. E lá embaixo tem pessoas que provavelmente foram executadas aqui. Ainda estão com seus corpos quentes e sangrando.
— Eu disse que era uma cilada. — fala Miguel.
— Hein?! Cilada?! — pergunta Rafael.
— Esquece. — responde Raguel. — Vamos sair daqui.
Mais tiros atingem o carro perfurando a lataria. Raguel corre para dentro do carro e assume o volante, os outros três também entram e ela liga o carro e pisa fundo no acelerador. O carro desce a montanha arremessando pedras para trás. Então uma saraivada de tiros é dada contra o carro, o atingindo em várias partes.
— Porra! — fala Rafael. — Aqui dentro está cheio de gasolina. Se atingirem uma dessas garrafas a gente vai voar pelos ares! Pisa fundo, Raguel!
Raguel pisa mais fundo no acelerador e o carro sai de lado nas pedras. Ela tenta puxar o carro de volta, mas perde o controle e ele sai em ziguezague até chegar à pilha de corpos. Ela então consegue trazer o carro de volta a linha reta e podem-se ouvir os corpos se despedaçando embaixo dos pneus. O carro patina sobre os corpos para poder avançar.
— Eles continuam atirando na gente! — exclama Rafael. — Não tem como ir mais rápido?
— Se tivesse como, eu já estaria fazendo isso! Essa é a velocidade máxima que eu posso ir sem atolar o carro no meio desses corpos.
— Merda!
Os tiros atingem os pneus do lado esquerdo e o carro inclina de leve. Raguel consegue manter o carro firme e atravessa o pequeno rio de corpos e chega do outro lado, onde há mais escombros.
— Ufa! Consegui. — fala ela.
— Então acelera essa porcaria o máximo que der! — fala Miguel.
Então ela acelera o carro e arranca dali em alta velocidade e não percebe que mais a frente há uma inclinação maior ainda. O carro voa de cima dos escombros.
— Aaaaaaaahhhh!!!!! — gritam todos.
O carro permanece no ar por alguns segundos e então se choca violentamente de frente contra um carro destruído. Raguel é arremessada pelo pára-brisa e voa por vários metros. E o carro capota por cima do outro e cai virado com as rodas para cima. Gasolina começa a vazar e alguns segundos depois o Ford Edge explode.

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