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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Um Mundo em Caos - 12


Um dia e meio se passou desde que Miguel e Raguel chegaram à casa de Rafael. Miguel esteve dormindo por exatas trinta horas. Um bom tempo para seu corpo descansar e recuperar um pouco suas energias. Os dias anteriores foram bastante terríveis para ele. Não somente para ele, para Raguel também. Dias trágicos. Em outra situação isso poderia deixar os dois traumatizados para o resto da vida. Teriam que ter acompanhamento psiquiátrico, entre outras coisas. Mas da forma em que o mundo se encontra hoje, eles não podem se dar a esse luxo.
Miguel está no pátio na parte dos fundos. Como ele está sem camisa é possível ver o curativo que fizeram nele. Seu ferimento está protegido por uma extensa bandagem que dá a volta no seu tronco. Gabriel se aproxima dele e diz:
— E aí, como está?
— Bem melhor. — responde. — Mais alguns dias e meu olho já estará melhorando e depois esse corte que me fizeram.
— É meu amigo, você deve ter perdido muito sangue.
— Mas ainda estou vivo. E isso é o que mais importa. Pena que foi ao custo da vida de outro ser humano.
— A Raguel comentou comigo. — fala colocando a mão sobre o ombro de Miguel. — Mas precisamos estar preparados para isso. No começo não era apenas o Rafael e eu. Havia mais três pessoas conosco. Mas com o decorrer do tempo infelizmente foram nos deixando. Malditos zumbis! Ver as pessoas serem devoradas na nossa frente é odioso!
— Eu sei... — fala Miguel baixando a cabeça.
— Desculpa cara. Esqueci que você viu a Jenny e depois essa sua outra amiga. Foi mal mesmo.
— Nem encana com isso. Mas me fala aí, quando vocês decidiram ficar aqui?
— Lembra que a gente se reunia aqui antes das coisas ficarem piores? — Miguel responde que sim e Gabriel continua, — Você não pôde mais vir, mas o Rafael e eu continuamos a nos reunir. Só que num desses dias as coisas fugiram do controle e as pessoas pareceram enlouquecer. Não dava para sair na rua. Eu quase fui morto por um vizinho do Rafael que me atacou com uma faca. Então os zumbis vieram e o massacre começou.
— Massacre. — fala Miguel.
— O que tem?
— Isso me lembra 1998, lembra?
— O Massacre está chegando?
— Isso. Bons tempos aqueles. Ah, se fosse possível voltar no tempo.
— Nem me fala.
Nisso, Rafael se aproxima deles com três latinhas de Brahma e pergunta:
— O que estão tricotando aí?
— Sempre engraçadinho. — responde Miguel. — Estávamos conversando sobre o que aconteceu aqui e então me lembrei da época do Massacre.
— Boa época. — fala entregando uma latinha de cerveja pra cada um. — O mundo era perfeito. Não precisávamos fazer nada e podíamos jogar videogame o dia todo.
— O Gabriel que o diga. Matava aula só pra ficar jogando.
Os três começam a rir ao se lembrarem do passado e Raguel grita da janela:
— Almoço pronto!
— Opa. — fala Gabriel. — Comida de verdade.
— Antes de irmos. — fala Miguel colocando a mão sobre o ombro de Gabriel. — Há muitos mortos-vivos lá na frente. Demais até. O muro não vai agüentar muito tempo.
— Depois eu cuido disso como faço quase todos os dias. — responde Gabriel.
— Como assim? Explica melhor.
— Eu chamo a atenção deles e os levo para bem longe daqui. Depois volto por outro caminho. Mas eles acabam voltando.
— E como faz isso?
— Tá vendo aquela moto ali?
— Sim. Uma Hornet 600.
— Uso ela. Muito boa por sinal. Graças a ela consigo buscar comida pelo menos uma vez por semana.
Então Raguel caminha até eles e diz:
— Mas vocês conversam, hein, guris? A comida vai esfriar.
— Estamos indo. — fala Rafael.
Eles vão se alimentar e enquanto degustam o arroz com lingüiça que Raguel fez, Miguel questiona porque eles ficaram na casa e não foram para outro local. Ele se usa como exemplo e diz que não agüentava mais ficar no mesmo lugar.
— Nós não pensamos em passar o resto da vida aqui. — fala Rafael. — Íamos seguir para outro local em breve. Mas preferimos permanecer por mais tempo aqui para ver se você aparecia. Sabíamos que você tentaria chegar aqui.
— Realmente você está certo. Mas poderia ter acontecido algo com vocês.
— Estamos bem protegidos aqui por enquanto.
— E para onde pretendem ir? — pergunta Raguel.
— Pensamos em seguir para Porto Alegre. — responde Rafael. — Depois dos bombardeios que a capital sofreu, acreditamos que lá seja o lugar mais seguro.
— É certo que o centro esteja livre dessas criaturas, e comida deve haver nos arredores. — fala Gabriel.
— Mas deve estar tudo destruído. — coloca Miguel.
— Talvez. — fala Gabriel. — Não podem ter destruído tudo. E o principal, imagina o que deve ter de carros do exercito lá. Jipes, picapes, SUVs, meios de transporte não irão faltar.
— Vendo por este lado. Você pode estar certo. — concorda com ele Raguel.
— E quem sabe eu não encontro meus pais. — fala Miguel. — Está certo. Vamos rumar para Porto Alegre. Todos concordam?
Cada um responde que sim e eles continuam sua refeição.
Mais um dia se passa e como Gabriel havia explicado anteriormente para Miguel, ele afasta momentaneamente os mortos-vivos da casa. E também aproveitou para buscar remédios numa farmácia que não fica muito longe de onde estão. Ele trouxe antibióticos, antiinflamatórios, gazes, esparadrapos, pacotes de algodão e para Raguel trouxe shampoos, condicionadores e outros utensílios de uso feminino. Ele retorna com a moto pelo pátio do vizinho dos fundos da casa de Rafael. Miguel parece estar um pouco melhor, não sente mais tantas dores e está traçando o possível trajeto até Porto Alegre. Rafael aproveita para olhar o motor do crossover, colocar água no reservatório e checar o óleo. Aparentemente cada um tomou para si uma função. Menos Raguel que está deitada bastante pensativa.
A porta do quarto está aberta, mas Gabriel bate nela antes de entrar.
— Oi. Posso entrar?
— Claro. — responde ela. — Aconteceu alguma coisa?
— Não, só vim lhe entregar essas coisas que peguei na farmácia. — responde entregando para ela uma sacola de plástico com as coisas que ele trouxe.
— Coisas para mim? Deixa ver... Ai... Shampoo, condicionador, perfume, maquiagem, esmalte... ai meu Deus! Você é um amor Gabriel. Aiaiai, tem mais coisas! Nem sei o que dizer. Muito obrigada!
— Capaz. Sabia que você ia gostar.
— Cheguei e já estou incomodando. Você deve ter mudado seu trajeto por minha causa.
— Na verdade eu teria que ir de qualquer jeito. Não podia deixar o Miguel sem tomar remédios para ajudar na cicatrização e fazendo a lista ontem incluí essas coisas que sei que você precisa. E não foi incomodo, foi um prazer.
— Mais uma vez obrigada.
— Agora se me dá licença, vou ver se eles estão precisando de alguma coisa.
— Tá bom.
Gabriel sai e Raguel fica mexendo na sacola para ver as outras coisas que ele trouxe. Ele vai até o encontro dos amigos e Miguel sorrindo diz:
— É um Romeo, né?
— Como?!
— E ainda se faz de desentendido. — fala Rafael sorrindo.
— Ah, vão se catar vocês dois!
— Viu como ele entende. — fala Rafael dando um tapinha nas costas de Gabriel.
Apesar de todas as coisas que aconteceram na vida de cada um deles, juntos parecem não se importar com isso. É como se em determinados momentos o mundo continuasse igual. Sem mortos-vivos, sem nenhum perigo ao redor deles. Apenas a alegria no sorriso de três jovens que ainda possuem no seu interior a inocência de uma criança que fantasia monstros e mundos incríveis cheios de perigos e seres fantásticos.  Três amigos que podem sobreviver num mundo que hoje os odeia. E não podemos nos esquecer dela...
— Do que vocês tanto riem? — pergunta Raguel.
— Oi Julieta. — fala Miguel rindo.
— Ah não. Era só o que faltava. — Raguel corre até Miguel e dá uma gravata nele e diz: — Do que você me chamou mesmo?
— Julieta. — Responde rindo.
Os dois caem no chão e os quatro passam a rir compulsivamente.
— Esse tombo foi bonito. — fala Rafael. — Pena que você não possui o dom de cair em câmera lenta igual ao Gabriel.
— Não entendi. — fala Raguel. — Câmera lenta?!
Miguel, Gabriel e Rafael se olham e caem novamente na gargalhada.
— Eu continuo não entendo! Podem parar de rir? Eu quero saber!
Mas ela não resiste e é contagiada pela risada deles. Na verdade, agora eles são quatro amigos que riem como se nada mais importasse. Só aquele momento. Muitos acontecimentos afastam pessoas e destroem amizades. Mas o que aconteceu com eles foi ao contrário, os fortaleceu, uniu ainda mais os três que agora contam com a amizade sincera e verdadeira da Raguel. Eles não possuem nada de valor para presentear um ao outro. Mas possuem algo muito mais valioso que qualquer coisa na face da Terra. A amizade e a lealdade de verdadeiros amigos. Algo que não se compra e não se dá. Conquista-se.
Mais um dia se passa e alguns zumbis começam a aparecer pela rua.
— Eles estão voltando. — fala Miguel.
— Não são eles. Esses são os que ficam nas ruas ao redor daqui. — explica Gabriel. — Os que eu levei ainda levam uns três dias para começarem a aparecer por aqui novamente.
— Hummm... é bom saber.
Rafael sai caminhando de dentro de casa com o braço esquerdo para trás e olhando para Miguel pergunta:
— O Miguel, cadê a sua espada?
— Ficou no shopping. Igual a: está perdida para sempre.
— Entendo. Mas acho que tenho algo aqui que você vai gostar. — Rafael então movimenta o braço para frente e o que ele trazia escondido as suas costas era uma espada de proporções grandiosas. — Pra você.
— Pra mim? — pergunta Miguel surpreso.
— Sim. Pode pegar.
Miguel pega a espada e a retira da bainha e emocionado diz:
— Caraca! Essa é a sua bastarda. A espada que você encomendou do Japão há três anos. E que não é uma replica, mas sim a original.
— Agora ela é sua. Olhei no carro de vocês e não a vi em lugar algum. Então deduzi que você a perdeu ou então que ela havia quebrado.
— Caraca! O retalhador está de volta! Me aguardem zumbis. — ele então gira a espada no ar e após fazer alguns movimentos meio sem sincronia e um tanto atrapalhados, diz: — Preciso treinar. Ela é muito maior que a outra e levemente mais pesada.
— Suas aulas de kendo vão ter que servir para alguma coisa agora. — fala Gabriel.
— É o legítimo pistoleiro ninja. — sorri Rafael.
— Só faltou o uniforme. — comenta Raguel da janela.
— Pistoleiro ninja?! Aí vocês tão de sacanagem comigo. — fala Miguel sorrindo. — No máximo o Scorpion melhor armado.
— Vou costurar uma roupinha amarelinha pra você. — fala Raguel. — Vai ficar igual às pilhas amarelinhas.
— To sacando vocês. É um complô contra a minha pessoa, né?
— Que é isso? No máximo pegando no teu pé. — fala Gabriel rindo.
Miguel guarda a espada na bainha e então com um tom sério na voz diz:
— E aí, quando vai ser a nossa partida?
— Pensei em amanhã. — responde Gabriel.
— E o que vamos levar daqui?
— Não muita coisa. — responde Rafael. — Não acumulamos nada aqui que possa ser muito útil. Apenas os kits de primeiros-socorros que temos, os remédios, o fogão portátil, os quatro botijões de quatro quilos que pegamos numas casas, algumas roupas de cama e acho que é isso.
— É basicamente isso. — completa Gabriel. — E já ia me esquecendo de uma coisa. A minha Hornet vai junto.
— Onde iremos enfiar uma moto? — pergunta Miguel.
— No bagageiro. — responde Gabriel.
— Tá bom. Ela vai junto então. — fala Miguel.
— Então precisamos começar a arrumar as coisas. — fala Raguel indo para dentro de casa. — Eu arrumo aqui e vocês se viram aí pra colocar essa moto em cima do carro.
— O pesado sempre fica com a gente. — comenta Miguel.
— Ninguém mandou vocês nascerem homens. — grita Raguel de dentro de casa.
Miguel sorri e então Gabriel caminha até a moto e a leva para perto do carro. Gabriel então diz para Miguel pegar uma corda e subir em cima do carro. Rafael e Gabriel erguem a moto quase a colocando em cima do carro e Miguel amarra a corda nela e desce do carro e amarra a outra ponta da corda numa árvore. Gabriel dá a volta e puxa a corda enquanto Rafael empurra a moto pelo outro lado e assim conseguem colocá-la no bagageiro. Rafael diz para irem ajudar a Raguel que ele amarra a moto. Gabriel e Miguel vão ajudar Raguel e recolhem tudo que irão precisar. Depois carregam tudo para o carro e colocam no porta-malas tudo aquilo que não precisarão ter a mão.
A noite chega e a lua reivindica seu lugar no ponto mais alto do céu. Gabriel diz que vai ficar de vigia durante a noite, mas os outros dizem que não é necessário devido à calmaria que está na rua. Cada um vai para um cômodo da casa descansar, mas Gabriel diz que vai dormir no sofá. Se sente mais seguro estando próximo da frente da casa e assim podendo acordar com qualquer barulho e avisar os outros com uma maior agilidade. Miguel deita na cama e fica pensando em Jennifer, em como seria bom se ela pudesse estar ali junto com ele e seus amigos. Se divertindo como antigamente. Rafael simplesmente se joga na cama e apaga, está cansado, mas pela primeira vez consegue dormir em paz. Sente-se mais seguro agora que sua equipe está completa, mesmo que uma dessas pessoas não seja a integrante original. Raguel fica por um tempo sentada na beirada da cama pensando em sua vida, na sua família, e então se deita e dorme abraçada ao filhote. Gabriel permanece no sofá de olhos abertos, concentrado em cada barulho que ouve. Fica por um tempo imaginando como será essa nova fase agora que estão reunidos. Sente então seus olhos brigarem com ele para fecharem e entregar seu corpo ao sono. Relutante, ele se deixa embalar pelo sono com um único pensamento: — Lutaremos lado a lado novamente.

2 comentários:

  1. Sem dúvida melhor capítulo que li até agora.
    Com certeza o Rafael é o cara mais fodão da história.
    ps: ele não é eunuco.

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  2. Esse foi bom de escrever. Me trouxe muitas lembranças engraçadas. Putz, escrevi dando muitas risadas. O pior é que não tem como lembrar sem rir sozinho.

    Mas espera que nos novos capítulos que estou escrevendo tem mais lembranças assim.

    Ele é tão foda que luta de marreta de concreto contra os zumbis!

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